6 de fev. de 2012

Poesia e Cinema

Belo Horizonte, MG, 4 de Fevereiro 2012

Manoel Hygino dos Santos
Poesia e cinema

Nascido em 1897, quase simultâneo com o cinema. Assim, Ronaldo Werneck começa trecho de um livro cuja leitura não pode ser negligenciada: "Humberto Mauro revisto por Ronaldo Werneck, editado pela artepaubrasil. A publicação não é rigorosamente, nova, tampouco velha. O que é bom vence o tempo e deixa marcas e sabores inesquecíveis. O vinho que o diga.O volume tem outro nome: "Kiryri rendáua toribóca opé", que o cineasta traduziu ao pé da letra como: "Calma lugar rancho alegre no", ou simplesmente "Lugar de calma e sossego no Rancho Alegre". Ora, seria um trabalho para brasileiro algum desconhecer, muito menos os mineiros.O livro é primoroso no texto, na concepção, na riquíssima iconografia, na felicidade do material - redigido, fotografado e extraído dos filmes. Enfim, algo para ninguém botar defeito e que, mais do que isso, deve ser preservado carinhosamente em lugar adequado, por conter o que agrada ao coração e ao espírito.Quem assiste ao cinema contemporâneo tem o dever artístico, histórico e cívico de conhecer Humberto Mauro, que nasce naquele remoto 1897, quando também nasceu Belo Horizonte como capital de Minas Gerais. Para se ter ideia da importância desse montanhês de Cataguases, poderia recorrer a Sheila Schvatzman, numa publicação da Unesp, de 2033. Ali, ela diz: "Mauro percorreu e construiu com suas lentes o país que se inventa e reinventa sem cessar. Colocou em movimento as imagens e o imaginário que conformaram o Brasil até então e continuavam a se produzir, dando-lhes a sua interpretação, acrescentando símbolos, reiterando outros... Humberto Mauro constrói um Brasil que vem a se tornar, elas mesmas, matrizes do cinema brasileiro".Ofereço tópicos do livro de Ronaldo para se avaliar a relevância do papel do cineasta e do poeta. O indomável Glauber Rocha, há 40 anos, deixou registrado: "...chamaríamos Humberto Mauro de puro, mas não de primitivo. E neste puro não está implícita a mínima relatividade. Puro como John Ford, puro como Griffith ou puro como o cinema intelectual de Eisenstein (…) Seu mundo é a paisagem mineira, o Mauro seria o único cineasta capaz de filmar Guimarães Rosa e dar no cinema a mesma dimensão do grande romancista".E diria o próprio cineasta de Cataguases: "A roda d'água, por exemplo, é de uma fotogenia extraordinária. Aquele rodar lento, os musgos, a água batendo contra o sol. Agora, troca por um motor a turbina e vê a porcaria que fica. Pega um carro de bois no topo de um morro, contra o sol, o candeeiro, o carroceiro em cima do cabeçalho - é de uma beleza incrível! Agora, tira e bota um caminhão fenemê: é uma droga. O progresso é antifotogênico".O poeta conterrâneo, que voltou ao lugar de nascença, diz que "revendo essas palavras, suas palavras-imagens, percebo como o cinema estava nele como se dele nascido, de tal modo que Mauro acabava sempre falando como se filmasse", extraindo beleza. Quem não ler e sentir esse livro, não conhece nosso cinema.

Postado por Kimura