18 de set. de 2024

DE ONDE VEM O POEMA


Ruínas romanas de Tipasa, classificadas pela UNESCO como Patrimônio Mundial


  Certa vez, convidado a falar sobre poesia, o poeta Federico García Lorca limitou-se a estender as duas mãos abertas e dizer: Yo no puedo, yo no sé hablar sobre poesia./ Yo la tengo aqui en mis manos, sé que está/ quemando mi piel, pero no lo sé o que és. De onde vem, como nasce o poema? Ferreira Gullar dizia que era do espanto. De certa forma, estava certo. Mas não é só disso, de espantar-se com o mundo, com o acontecimento, que surge o poema. Ele vem às vezes do alto, como no avião que vi cortando o céu de Botafogo, numa manhã carioca da semana passada. Avião que me levou de volta exatamente a um dos meus poemas prediletos de Gullar, vindo lá dos anos 1970, “Por você por mim”: 

  É dia feito em Botafogo/ Homens de pasta, paletó, camisa limpa, dirigem-se para o trabalho./ As pessoas marcaram encontros,/ irão ao cinema,/ à buate,/ se amarão nas praias/ na cama/ nos carros./ Nenhuma ameaça/ pesa sobre a cidade./ O avião no céu/ vai para São Paulo./ O avião no céu/ não é um Thunderchief da USAF/ que chega trazendo a morte/ como em Hanói./ Que se passa em Huê? em Da Nang?/ No Delta do Mekong?/ Te pergunto,/ nesta manhã de abril no Rio de Janeiro,/ te pergunto,/ que se passa no Vietnam?

    Alguns dias após a morte de Ferreira Gullar (São Luís do Maranhão, 10.09.1930/ Rio de Janeiro, 04.12.2016), eu publicava em meu blog três vídeos que acabara de editar sobre o poeta, inclusive um em que eu havia gravado o poema “Por você por mim”, que pode ser visto no link a seguir: Por você Por mim - Ferreira Gullar por Ronaldo Werneck ( https://youtu.be/BKFFWK_8cTA )

    O poema então – além do espanto, como dizia Gullar – surge também da memória, às vezes de um avião no céu que me leva ao poema de Gullar, que me leva ao Vietnam. E, pelo menos para mim, o poema, qualquer poema, tem muito do olhar, de observar o mundo com olhos aguçados, olhos de ver/apreender. De desenvol/ver. Situações, paisagens, lembranças, alguma coisa sensorial perdida no tempo e que volta súbito e nos enlaça sob a forma de poema. E nos traz para o agora. Imagem + palavra: inventividade, experimentação.  Palavras fora do dicionário, como em Drummond: “Já não quero dicionários/ consultados em vão./ Quero só a palavra/ que nunca estará neles/ nem se pode inventar”. 

    Isso tudo para dizer do estranho (e “espantoso”?) nascimento do poema que vai a seguir – e que ficou por quase 50 anos embrionário em minha cabeça. Era um verão literalmente africano na Argélia, setembro de 1979. Eu caminhava solitário e sem rumo por uma praia deserta nas proximidades de Chéraga, na província de Argel. O vento vinha do mar, levantava a areia e batia suave em meu rosto. Nunca mais, em toda a minha vida, eu me esqueci desse momento iluminado, de absoluta plenitude, uma quase epifania. Voltava de uma visita que me emocionara a Tipasa, exatos 69 km de Argel – a pequena Tipasa, a cidade argelina hoje Patrimônio Mundial da Humanidade, debruçada sobre o Mediterrâneo, com seus penhascos, suas escarpas e ruínas romanas. 

    “O mar/ la mer aussi/ e ruínas/ romanas/ e belas”– como no meu poema L´après-midi à Tipasa, escrito ainda em 1979 e publicado anos depois em meu livro “minerar O branco” (Editora Artepaubrasil, São Paulo, 2008).  Eu fora a Tipasa levado por lembranças de Albert Camus, um de meus “escritores de cabeceira”, e de seu icônico “Bodas em Tipasa” – uma “ode ao sol”, cujos textos relia numa edição francesa comprada em Paris: Noces à Tipasa (tônica no último “a” de Tipasa, como no bom francês, s´il vous plaît). 

    Au printemps, Tipasa est habitée par les dieux et les dieux parlent dans le soleil et l´odeur des absinthes, la mer cuirassée d´argent, le ciel bleu écru, les ruines couvertes de fleurs e la lumière à gros bouillons dans les amas de pierres grellés.  Assim, Camus abria seu livro. Numa rápida tradução: “Na primavera, Tipasa é habitada pelos deuses e os deuses falam sob o sol e o aroma dos absintos, o mar blindado de prata, o céu puro azul, as ruínas cobertas de flores e a luz fervendo nas pilhas de pedras de granito”. 

    Mais tarde, em Retour à Tipasa, escreveria Camus: Il n´est pas pour moi un seul de ces soixante-neuf kilomètres de route qui ne soit recouverte de souvenir et de sensations. Lembrança e sensações: pontos de partida e chegada. Fulcros da feitura do poema. De onde vêm, para onde vão os poemas? Em 1961, dentro das ruínas romanas de Tipasa, de frente para o mar e para o monte Chenoua, foi erguida uma stela em homenagem a Albert Camus com esta frase em francês extraída de sua obra “Noces à Tipasa”: Je comprends ici ce qu'on appelle gloire : le droit d'aimer sans mesure. (“Entendo aqui o que se chama glória: o direito de amar desmedidamente").  

    Então, naquele setembro de 1979, não era a primavera de Camus, mas sim o final de um abrasivo verão. E em Tipasa eu vira ainda há pouco a luz ferver ainda com mais intensidade nas pedras empilhadas penhasco abaixo até o mar blindado de prata. Ainda há pouco: imagina, há 50 anos! E essa imagem não me sai da memória. Agora, 2020, é outro verão no Shangrilá, o sítio que temos no alto de um morro, nos arredores de Cataguases, de frente e em panorâmica sobre as montanhas de Minas.  Ilhado há meses pela pandemia, leio numa rede, o mundo-minas em plano geral, o mar de morros.  

    Vejo avencas, acácias. Vem um vento a bater suave em meu rosto – o mesmo daquela tarde em Argel? O mar de morros. Mediterrâneo? Avencas, acácias? Há um forte aroma de tâmaras (dattes! dattes!) vindo de longe, de não sei onde. Não! Eu sei de onde. Esse vento, esse aroma na memória, essas improváveis tâmaras – Argel ressurge súbito no ritmo oitavado desse poema, até mesmo na métrica de seu título. Ritmo só atravessado por duas súbitas estrofes em redondilhas menores, a ressaltarem a “palavra palavra/ para sempre fica/ pois é poesia”. Tipasa está aqui, nessa tarde, nesse après-midi, pois a trago comigo ainda agora – e para sempre: o mar/ o mundo/ a recomeçar/ au jour-le jour/ tous/ tous les jours/ todos/ todos/ os dias todos/ sob luz intensa/ sempre/ nova/ luz/ a pris´mar/ plátanos/ tâmaras/ absintos. 

Link para os poemas 
OITIS AVENCAS O VENTOL´APRÈS-MIDI À TIPASA:

https://drive.google.com/file/d/1p4HAi9sRZ4fYUpz2DFRlG2JtyuiT00CN/view?usp=sharing






















2 de set. de 2024

PAULO AUGUSTO: A FALTA QUE FAZ

 


Belo Horizonte, 2011: lançamento de meu livro “Há Controvérsias 2” na Livraria Mineiriana. Enquanto autografo, Paulo Augusto solta uma daquelas risadas inesquecíveis. Ao lado, de preto, nosso saudoso amigo, o cineasta Geraldo Veloso.


“Nosso amigo Paulo Augusto morreu ainda há pouco“– ouço ainda agora a voz do escritor e roteirista Mário Alves Coutinho, vinda lá de Belo Horizonte, no último 23 de julho.  Era tarde da noite e ao ouvir o tom grave de sua voz ao telefone já imaginava o que ele ia me dizer. Paulo Augusto Gomes, meu querido cineasta, passou por vários problemas de saúde nos últimos tempos e estava morando há meses numa casa de repouso. Chegamos a nos telefonar algumas vezes. Sua voz estava meio claudicante, mas meu amigo mostrava-se lúcido e bem-humorado: como sempre, falamos de cinema, literatura e música, três de nossas paixões. Não pude ir a Belo Horizonte para vê-lo pela última vez. No dia seguinte ao funeral, consegui enviar meus sentimentos para sua filha Elena, que conheço só de nome, só de ouvir Paulo Augusto escrever em nossos muitos e-mails.   

Paulo e eu nos conhecemos em Cataguases, quando da festa dos 70 anos do escritor Francisco Inácio Peixoto, em 1979. A amizade brotou de imediato. E não mais deixamos de nos falar, quer por infindáveis e-mails ou por encontros sempre que eu ia a Belo Horizonte, ou quando veio em 2021 para o lançamento de meu livro “Cataguases Século XX”, com belo texto de orelhas escrito por ele.

E nosso amigo em comum, o poeta Francisco Marcelo Cabral (O “Chico Cabral”, morto há exatos dez anos, em 20.08.2014 – e sobre quem acabo também de republicar aqui no blog um “texto-hommage”), era personagem sempre presente em nossa troca de e-mails, como nesse enviado por Paulo Augusto em 27.10.22: “Hoje, folheando "De Anchieta aos Concretistas", recolha de textos do grande Mário Faustino, na famosa seção "Poesia Experiência" do JB, dei com o nome do querido Chico Cabral em mais de uma página. Nos idos daqueles anos 50, devia ser mesmo um dos mais promissores poetas da nova geração brasileira”. 

Na mesma hora, eu respondia: “De repente dou de cara com “De Anchieta aos Concretos”, edição referida por você, da Companhia das Letras. Havia me esquecido, a gente vai esquecendo vida afora. Não só não me lembrava como vejo agora que marquei várias passagens do livro, muita coisa quando ele se refere às minhas hoje saudosas amigas, Marly de Oliveira (que foi casada com o João Cabral e antes com meu amigo, o Embaixador Lauro Moreira) e Lélia Coelho Frota (que esteve aqui em Cataguases em 2003, junto com uma pá de poetas e amigos do Chico Cabral quando ele lançou o seu “Livro dos Poemas de Francisco Marcelo Cabral”). 

Sobre Chico Cabral, vejam também aqui no meu blog a postagem que fiz quando dos três anos da morte do querido poeta – meu grande, imenso amigo: https://ronaldowerneck.blogspot.com/search?q=Chico+Cabral.

Nós dois nascemos e moramos na mesma rua em Cataguases e eu às vezes falava – brincando, mas  meio a sério – que nem o melhor poeta da rua Dr. Sobral eu conseguira ser, pois havia ele. Pois bem, num email de 2013, um ano antes de sua morte, ao ver/ouvir/ouver meu vídeo-poema Duas Faces, ele me dizia: Duas Faces me comoveu às lágrimas. O poeta tentando recapturar o poema  na memória e vivendo uma luta de cuja vitória renuncia numa entrega emocionante. Embora saiba  que Nino Rota é uma grande paixão, a repetição do tema de Amarcord acrescenta ao tema da memória e sua perda uma agonia e uma dor "perceptíveis ao tato". É um curta pronto para qualquer concurso. Você resolveu o enigma e é de fato o maior poeta da Rua Dr. Sobral. Beijos emocionados deste seu Chico Cabral”. Há Controvérsias, como sempre digo. Vejam a seguir o link para o vídeo-poema Duas Faces:

https://www.youtube.com/watch?v=vPBaj4Lah0w&t=11s

Voltando ao Paulo Augusto: foram mesmo inumeráveis os emais trocados entre nós ao longo dos anos. Como esse, que ele me enviou em 30.05.2023: “Muito surpreso fiquei com a morte de Carlos Alberto Prates Correia. Liguei para Ronaldo de Noronha, velho amigo dele, que ficou arrasado, também não sabia. Já Mário (Alves Coutinho) tinha recebido a notícia dois dias atrás, quando se deu a morte. Enfim, todos reagiram mais ou menos da mesma forma: a fila está andando. Mais hora, menos hora, chega a nossa vez”.

Dias depois, ao comentar sobre a morte de nosso amigo, o cineasta Carlos Alberto Prates, eu dizia que estava virando um habitué de obituários, tantos amigos que se foram, e pensava em publicar um livro sobre as mortes de amigos e pessoas de minha admiração, com o título Que falta fazem. Paulo Augusto terminava assim seu email: " Que falta fazem é um muito bom título, o perigo é virar um obituário de mão única. Buñuel dizia que anotava em um caderninho os nomes dos amigos que iam partindo, até que um dia foi surpreendido pela presença de alguém cujo nome havia erroneamente listado”.

Pois é, meu querido Paulo Augusto, “a fila está andando. Mais hora, menos hora chega a nossa vez”. Só não esperava que fosse tão cedo a sua vez. Ao contrário de Buñuel, e infelizmente, sua morte não foi anotada erroneamente em meu caderninho. Nada tem de ficção. Ela é dolorosamente real – e já faz mais de mês que bate forte a falta que você nos faz.

Em sua elegia quando da morte do poeta Sierguéi Iessiênin, escreveu o grande Maiakóvski, traduzido pelo não menos Augusto de Campos: “Difícil e inútil/ excogitar enigmas./ O povo,/ o inventa-línguas,/ perdeu/ o canoro/ contramestre de noitadas”. Com a morte de meu querido Paulo Augusto, nada mais de “cartearmos” (apud Rosário Fusco) por meio da “modernidade” de e-mails – nós que sempre fomos verdadeiros dinossauros pré-históricos, anteriores à informática. Na verdade, perdi meu afinado interlocutor eletrônico, o “canoro contramestre” de nossos papos mais que perfeitos. Ainda Maiakóvski: “Você partiu,/ como se diz,/ para o outro mundo/ Vácuo.../ Você sobe/ entremeado às estrelas/ Nem álcool, / nem moedas./ Sóbrio./ Voo sem fundo”.

A seguir, um pequeno apanhado ao acaso de nossos muitos e-mails nos últimos anos.


PAG/RW & RW/PAG

EMAILS AO ACASO 

Casa dos Contos, Belo Horizonte, 23.10.2014. Jantar de meu aniversário com cineastas e amigos: à esquerda, em primeiro plano, Mário Alves Coutinho e Jeanne, sua ex-companheira; a saudosa poeta Flausina Márcia; Anita, então  namorada do também saudoso Geraldo Veloso, que está ao fundo. À direita, Mário Lúcio Brandão; Patrícia; eu e Paulo Augusto, a presença do amigo de sempre. 


2012

20.09.12


Foi só eu lhe enviar o e-mail anterior há uma meia hora e recebo agora o "Cataminas Pomba e Outros Rios". Que bela edição! O formato me conduziu de imediato a 1978, quando Joaquim Branco me deu um exemplar do seu "Pomba Poema"; as fotos, a fortuna crítica, sobretudo – claro – os poemas, me deixaram encantado. Já passeei por vários deles e quero retornar a cada um. Você é mesmo um craque, daqueles que nos deixam viciados na sua forte e bela poesia. Muitíssimo grato. Insisto: falta, agora, você em BH, para alegria dos seus muitos amigos. Abraço grande, Paulo Augusto


2014

19.03.2014

Ronaldo, amigo de sempre,

Recebi o livro-antologia (belos poemas!) e os DVDs, sobre Mauro (que já vi e amei) e Inexílio, para rever o querido Chico Cabral em movimento, ele que nunca parou. Que material rico! Gratíssimo! Li todas as suas colunas publicadas até agora com a entrevista do Fusco. Que figuraça! Era um grande provocador, no melhor sentido da palavra, que faz muita falta no Brasil de hoje, quando as provocações são de nível rasteiro e muitas delas nem ao menos fazem sentido. Estou aproveitando e me divertindo/aprendendo muito. Gratíssimo e um grande abraço, extensivo a Patrícia. Paulo

 

09.04.2014

Ronaldo, amigão,

Venho lendo a genial entrevista de Fusco, um pouco como os antigos seriados americanos, um capítulo por semana. O próximo será o último, não? Mas, mesmo Fusco se declarando morto na matéria, estou certo de que ele não morrerá no final - nem nunca. Beijabraços pra você e Patrícia, comme il faut. Abracíssimo do seu velho, Paulo

 

15.05.2014

Ronaldíssimo,

Fusco não vale um livro, como o que você fez sobre Mauro? Eu adoraria ler, até porque não tive o prazer de conhecê-lo. Quando fiz "Os Verdes Anos"(documentário sobre a revista Verde, 1979) ele já não estava entre nós. O que acha da ideia? Ele era mesmo um espetáculo. Abraço grande, também a Patrícia, Paulo

 

02.09.2014

Caríssimo Roneck,

Só mesmo Veloso (Geraldo Veloso, nosso hoje saudoso amigo cineasta) compete com você em termos de contatos com grandes figuras. Taí: por que, como ele, você não começa a escrever suas memórias? Eu adoraria ler! Beijabraços pra você e Patrícia. Paulo

 

12.12.2014

Caríssimo Ronaldo,

Fico sempre feliz ao ver o quanto sua obra toca tantas pessoas. Isso só acontece pelo valor intrínseco (gostou?) dela – e gosto que seja assim. Seu leitor sempre atento (e com as mãos já calejadas pelos muitos aplausos) e, mais que isso, sempre amigo, Paulo (lembranças a Patrícia!)

 

2017

https://ronaldowerneck.blogspot.com/search?q=Monica+Vitti


30.11.2017

Ronaldo, amigo,

Li - e gostei muito - a entrevista com Monica Vitti. É uma mulher inteligente, que acho muito bonita, apesar dela não se ver assim. Já pensou em editar essas entrevistas em forma de livro? Acho que daria um volume importante e cheio de novidades, pense nisso. Pelo que vejo, seu baú está cheio de preciosidades; bote todas as belezas para fora, poeta! Certa vez, pensei em fazer o mesmo, mas não tenho tantos encontros assim com homens (e mulheres) notáveis: cineastas como Mauro, Abraham Polonsky, Jean Douchet, Jacques Demy; escritores como Drummond, Pedro Nava, mais um ou dois. Não seria suficiente para um livro. É sempre bom ouvir o que gente boa tem a dizer. Abraço, Paulo.

Paulo meu caro Augusto,

Boa ideia essa do livro. Quem sabe? Vou pensar. Agora, que modéstia é essa? Mauro, é claro, já sabia. Mas, nossa!, encontros com gente como Polonsky, Douchet, Demy (gosto dele, de Lola principalmente, mas mais ainda da Agnès Varda: você viu o admirável Les Plages d´Agnès onde aliás ela fala com muito carinho de Demy?). E ainda Drummond e Pedro Nava. O que você queria mais? Nomes que já dão pra fazer história, uma história que você bem pode contar. Abraço forte, Ronaldo


01.12.2017

Ronaldo, caríssimo amigo,

Não lhe contei mas, na minha viagem a Ouro Preto com Demy, Agnès Varda estava obviamente junto. Tenho, de cada um deles, uma foto autografada; a dela é mais calorosa, desejando-me que eu fizesse no futuro um grande filme. Sim, conheço e tenho "As Praias de Agnès" e, você tem toda razão, é um belíssimo filme. Como também o são os três filmes em que ela abordou Demy e sua obra: Jacquot de Nantes, Les Demoiselles ont eu 25 Ans e L'Univers de Jacques Demy. Tenho os três; caso você tenha interesse, é só me dizer. Na relação de notáveis que enumerei, não cheguei a entrevistar Drummond ou Pedro Nava; foram apenas bons (ótimos!) contatos, amáveis e amenos, com eles. O mesmo com Douchet. Ficaram os autógrafos nos livros de cada um, o mesmo acontecendo com Paulo Emilio Sales Gomes. De qualquer modo, vou pensar na possibilidade de tudo isso ganhar corpo e, talvez, virar um livro.

Grande abraço, Paulo 

 

22.12.2017

Meu poeta querido,

Natal é uma época do ano que, para mim, perdeu totalmente o sentido após a morte de meus pais. Eles, que vinham de uma longa tradição católica, preparavam uma árvore cheia de bolas e enfeites, um presépio montado na lareira e uma ceia deliciosa. Agora, tudo isso são apenas lembranças – sem que, por este motivo, eu precise ignorar a festa que virou, para mim, exclusivamente comercial. Então, caríssimo, que você e Patrícia passem um Natal da melhor qualidade, em paz, alegria e saúde (espero que a coluna não lhe dê mais trabalho!). Na minha frente, estão os três filmes de Jacques Demy que lhe prometi, devidamente copiados. Apenas um deles, L'Univers de Jacques Demy, não deu reprodução. Eu o substituí por Parking, um dos últimos filmes dele, menos conhecido, uma adaptação do "Orfeu" de Cocteau aos tempos modernos (Orfeu agora é um cantor de rock), com Jean Marais fazendo Hades (ou, como diria minha antiga e primitiva babá, o Coisa Ruim). Os outros dois, Jacquot de Nantes e Les Demoiselles Ont Eu 25 Ans, de Agnès Varda, estarão também no pacote. Para concluir: seu poema natalino é delicioso. Abração, Paulo

 

2018

01.01.2018

Ronaldo, amigo querido,

Beijabraços também para você e Patricia (será que nos veremos, aqui, aí ou alhures – não resisto a esta palavra –, neste ano? Torço para que sim!) e um 2018 cheio de belas surpresas, sem sustos desnecessários que, às vezes, a vida cisma de nos proporcionar. Ah, não sei se já lhe contei: vou ser avô mais uma vez, só não sei ainda o sexo do bebê que está sendo gestado. O ano promete! Paulo

 

02.01.2018

Ronaldo, caríssimo,

Fim de ano é época de rearrumar velhos guardados; nos meus, reencontrei um lindo poema que Chico Cabral me mandou quando lhe participei o nascimento de Elena, minha primeira filha (na verdade, única, pelo menos até o momento), em 1979. Que baita saudade me bateu dele, poeta finíssimo e pessoa da melhor qualidade. Vieram à memória alguns encontros nossos (às vezes, você também presente), como quando aconteceu o lançamento do Verdes Anos e da edição fac-similar da Verde, aqui em BH, lembra? Abracíssimo, Paulo

 

 

2022

09.07.2022

Ronaldo, meu amigo.

Quem é Clara? Seu poema para ela é bem bonito. Pelo visto, esse nome inspira bem os poetas, haja vista a linda "Clara", de Caetano Veloso. Já Andy Warhol, acho um blefe; para mim, é especialista em se colar nas marcas (Campbell's) da sociedade que ele achava que criticava. Os filmes que fez, então, são uma lástima. Enfim, sempre há alguém disposto a pagar uma fortuna por uma "obra de arte". Estou fazendo melhor: lendo um livro fundamental sobre a verdadeira poesia da vida. É "O Arco e a Lira", do grande Octavio Paz, uma maravilha. Também é dos seus preferidos? Beijo para Patrícia, abraço grande que lhe manda o seu velho Paulo

 

09.07.22

Paulo, meu Augusto amigo,

Clara é a cadela dálmata que Patrícia e eu temos aqui em Cataguases. Veja a foto que ilustra o poema. Como se vê, eu também faço poema pra cachorro! Sim, a canção Clara do Caetano, de seu disco primeiro disco tropicalista, é uma beleza. Clara é irmã dele. Clara é nossa cadela. Dá tudo no mesmo no final das contas. Warhol impera no reino das controvérsias. Nem gosto lá muito dele. Na verdade, minha postagem é uma abertura (mas ninguém ainda sabe) para duas postagens sobre Marilyn Monroe (por isso aproveitei o gancho da venda do quadro de Warhol sobre ela) que vou fazer na sequência. Um poema pra ela e James Dean e uma postagem maior no início de agosto, quando vão fazer 60 anos da morte de MM. Sou fã da moça, e não abro. Acabo de reler o livro de Norman Mailer sobre ela: ótimo! Tenho vários e vários livros sobre MM, biografias, livros de fotos etc etc. Vamos ver o que vai sair daí, como vai rolar meu texto. Octavio Paz é dos meus poetas de cabeceira. O Arco e a Lira é livro fundamental pra quem gosta de poesia. Estamos chegando aí na quinta à noite. Nosso almoço na sexta, na Savassi, 14 horas, confirmadíssimo. Baitabraço, Ronaldo

https://ronaldowerneck.blogspot.com/2022/08/marilyn-monroe-o-intenso-frescor.html?fbclid=IwAR1cSsRJwYw7zv2vHvyRhG0GHOz9cNldArauiJUTxs424lRoNh59UeBJglQ


10.07.22

Ronaldo, meu amigão,

Claro!, nosso almoço está marcado para as 14 horas da sexta-feira. Encontro vocês no Café com Letras (gosto do nome!). Clara é uma graça; lembro-me dela quando estive no Shangri-lá. Ela que me desculpe a memória claudicante. Lembrei-me de outra bela música que tem o nome dela no título. É "Clareana", de Joyce, que a definiu como "pouco mais que uma berceuse" para suas duas filhas, que dão nome à canção. Integra um lindo disco dela, chamado "Feminina", conhece? Acho Joyce uma craque; foi casada com meu ex-colega Nélson Ângelo e há muito é a mulher de Tutti Moreno. Ah, agora entendi o porquê do seu interesse por Andy Warhol, e divido com você a admiração por Marilyn Monroe. Também tenho alguns livros sobre ela, de texto e fotos, a começar pelo de Norman Mailer. E vários DVDs com filmes dela, inclusive alguns raríssimos, a começar de "Scudda Hoo! Scudda Hay" (Torrentes de Ódio, 1948), o primeiríssimo, em que ela nem é listada no elenco, mas tem uma participação mínima, facilmente identificável, quando diz sua única frase, cumprimentando uma amiga que sai do culto dominical de uma igreja. Outro difícil de achar é aquele em que, pela primeira vez, ela faz parte da ficha técnica. Chama-se "Ladies of the Chorus" (Mentira Salvadora, 1948) de Phil Karlson. Além desses, vários outros. Se algum lhe interessar, é só me dizer. Fico no aguardo da sua chegada, enviando aquele grande abraço de sempre e desejando-lhes uma ótima viagem. Paulo A.


11.07.22

Paulo, Paulinho, Paulão

Só pra dizer, como não?, que também adoro Clareana, que chego a me emocionar com a delicadeza dessa canção da Joyce pras duas filhas. Claro que conheço o disco “Feminina”, como vários outros (tenho quase todos, assisti a várias shows dela). Envio em anexo uma crônica onde Joyce atua como “principal protagonista”. Ela faz parte do meu Há Controvérsias 2 (na verdade, é a última crônica do livro, ilustrada com imensa foto de pagina inteira de minha ídala Joyce). Envio essa crônica pois normalmente as pessoas passam “batido” num livro grande como é Há Controvérsias 2 –  502 páginas! – e acabam não lendo ele todo. Espero que goste de reler a joyceana crônica que segue em anexo.

Quanto a Marilyn: sim, li na época o livro de Mailer (não sei o porquê, mas tenho aqui em casa duas edições do livro, lançado pela Civilização em 1973). Reli agora o livro de Mailer, marquei algumas passagens que vão constar do texto que estou escrevendo sobre MM, que pretendo postar exatamente no dia 4 de agosto, 60 anos de sua morte. Et voilà! Antes, vou postar um poema sobre Bus Stop, que está em meu livro Revisita Selvaggia (vou tentar fazer uma animação, como aquela que fiz com o poema “Fellini/Roma” – te mandei esse vídeo-poema, não?). Como não chego nem perto de sua memória e de seus implacáveis arquivos cinematográficos, devo humildemente dizer que desconheço os filmes citados da MM. O mais antigo, de que tenho notícias, é O Segredo das Joias de John Huston, onde ela faz uma “inesquecível ponta”. Por acaso, destino tem dessas coisas, também o diretor de seu último filme, The Misfits. Isso porque Something´s Got to Give restou inacabado.

Então resta aqui também este email devidamente inacabado: nossos e-mails não acabam nunca, não é meu caríssimo? Baitabraço e até sexta, às duas en punto, com letras e café. Quer dizer, um bom vinho e tudo o mais. Ronaldo

 

11.07.22

Ronaldo, Ronaldim, Ronaldão,

Você me deixa com inveja: de Joyce, tenho apenas três CDs: "Passarinho Urbano", "Feminina" e "Água e Luz", cada um melhor que o outro. Minha admiração pela arte dela é imensa. Aposto que você e ela são amigos, acertei? Joyce, hoje em dia, quase desapareceu no meio da música caipira e do ziriguidum vulgar, que dominam o panorama atual da MPB. Pena: os novidadeiros não sabem o que estão perdendo.

Minha cabeça anda ruim: se você me mandou o vídeo "Fellini/Roma", terá sido daquela vez em que você copiou para mim tudo o que eu não tinha dele? Só pode ter sido, e não é difícil para mim checar; os Fellini estão todos juntos, embora numa prateleira alta. Vou conferir.

Já em relação a Marilyn, vou copiar para você os dois filmes que mencionei e mais alguma coisa. Você conhece "O Fim das Coisas", DVD que tem toda a minutagem filmada de "Something's Got to Give"? São mais de 30 minutos; o documentário fala do final da vida de MM, acho que tem inclusive aquele momento em que, com voz sensual, ela canta parabéns para John Kennedy ("Happy birthday, Mis-ter Pre-si-dent!"). "O Segredo das Jóias", por coincidência, revi neste último fim de semana, obra-prima admirável. Conversar com gente inteligente, culta e sensível é algo de que não posso prescindir, meu amigo. Por isso, me alegro cada vez que chega mensagem sua. Até sexta, com um bom vinho para celebrar. Por enquanto, segue meu abraço a Patrícia e você! Paulo


MARYLIN/ LA DOLCE VITA NEM SEMPRE TÃO DOCE

https://youtu.be/gDv_nOfIygg

 

11.07.22

Não, infelizmente não sou amigo de Joyce. Tenho até uma foto com ela no camarim de um de seus shows (onde andará essa foto?), ela, eu e a Leny Andrade, devidamente abraçados. Mas Leny não conta, pois só tinha olhos pra Joyce. Quem é amiga dela é minha ex-mulher, a cantora Daniela Aragão, que está inclusive escrevendo um livro sobre Joyce. Daniela, aliás, está escrevendo muito bem, o que muito me orgulha, pois eu a incentivei desde o inicio. Ela publicou recentemente um ótimo livro de crônicas sobre cantores, cantoras e compositores de nossa música, “De conversa em conversa”. E vai publicar dentro em breve, outro ótimo livro, memórias do bairro de São Mateus, em Juiz de Fora, onde morou desde menina (sou suspeito, pois acabo de escrever o prefácio desse livro).

Agora Fellini. Meu Zeus, falar de Fellini, é pra mim falar de paixão. Acho que não mandei o vídeo-poema sobre ele. Vai agora em anexo, junto com outros textos sobre meu ídolo. Fellini forever!

Abracíssimo e inté sexta, Roneck Wernaldo


FELLINI/ROMA

https://www.youtube.com/watch?v=5hSW2yY0wIA&t=2s

 

12.07.22

Roneckius, mein Freund,

Sim, Daniela, lembro-me dela, muito simpática sempre. Deu-me um CD que gravou, muito bonito. Gostaria de ler as crônicas musicais dela. E muito obrigado pelo belo vídeo felliniano e também os textos controvertidos. Tendo sido um deles, o de Joyce, incluído no segundo "Há Controvérsias", pensei: por que não (re)lê-lo no original, eu que já havia lido o livro inteiro, quando o recebi? Afinal, honradíssimo, fui um dos 22 ("dois times mais-que-perfeitos") a quem a obra foi dedicada! Assim o fiz – e acabei um pouco decepcionado comigo mesmo. Isso porque constatei o quanto minha memória anda me traindo. Não me lembrava de ter lhe enviado comentários (incluídos ao final) a respeito do seu belo texto sobre "Aquele que Sabe Viver", o maravilhoso "Il Sorpasso" de Dino Risi, que ambos admiramos. Nem do seu encontro en passant com a linda Catherine Spaak, que nos deixou neste ano, em abril. E também Trintignant, em junho, veja que coincidência.

Há muito não vejo Vladimir Carvalho. A bem da verdade, desde quando participamos do júri de um dos Festivais de Brasília, junto com o diretor de fotografia Fernando Duarte e o cineasta José Joffily. Não nos entendemos àquela época. Vladimir e Fernando defendiam um semi-documentário de Lúcia Murat, "Que Bom Te Ver Viva", enquanto eu achava que o melhor filme em competição era, de longe, "Minas Texas", de Carlos Alberto Prates Correia. E Joffily lavava as mãos, como Pilatos. Quando vi que, sozinho, eu iria perder, aceitei a derrota, mas impus a condição de que o filme de Carlos Alberto recebesse o maior número de prêmios. Com isso, acabei prejudicando o filme de meu amigo David Neves, "Jardim de Alá", que também competia e tinha muitos méritos. No avião de volta a BH e ao Rio, contei o episódio para David, que sorriu e disse que não importava. Mas me chateei.

Até sexta, amici. con un grande abbraccio del vecchio Paolo

 

13.07.22

Paulus-a-um,

Vou pedir à Dani pra mandar o livro dela pra você, acho que vai gostar. Sim, la Spaak e Messiê Trintignant nos deixaram, e ficamos cada vez mais abandonados. Isso em meio às novelhíssimas galáxias recém-descobertas por esse telescópio mais que poderoso, que nos reconduz a um universo que explode em cores fantasmagóricas, caleidoscópicas.  Quem diria que viveríamos para ver isso, para nos extasiarmos com isso!

Vladimir é um velho amigo, “um conterrâneo velho de guerra”. Nós nos conhecemos em 1964, em Feira de Santana, no lançamento do filme O Grito da Terra, do meu saudoso amigo Olney São Paulo. De lá pra cá estamos sempre nos vendo, nos falando quando e onde possível. Quando lancei meu livro sobre Rosário Fusco, Vladimir escreveu, para surpresa minha, um longo artigo no Correio Braziliense (veja no anexo). O artigo do Vlad “vendeu” uma quantidade considerável desse meu livro: ainda hoje recebo pedidos de compra do livro sobre o Fusco.

“Minas Texas” é um grande (mais um) filme do Carlos Alberto Prates (onde anda a emérita figura?), com uma bela interpretação de meu saudoso amigo Hélber Rangel (ou estou trocando as bolas e o Hélber está é em Perdida e Cabaré Mineiro?). Gosto de Jardim de Alah, gosto de quase todos os filmes do David. Principalmente gosto/gostava muito do David, meu companheiro de copo e papos nas noitadas da velha Copacabana. Não à toda, dediquei meu livro sobre Mauro pro David, um “maurólogo” por excelência.

Entonces é isso: em plenos preparativos para a viagem. E doido pra te encontrar entre papos & vinho, no savassiano almoço de sexta-feira.

Inté, Roneck

 

25.07.22

Ronaldíssimo, meu amigão,

Também foi motivo de grande alegria para mim rever você e Patrícia. Pena que foi por tão pouco tempo. E o show foi bom? Aqui, meu caro, tive um fim de semana estranho. De uma só vez, pifaram meu telefone (caiu no chão), meu computador (o cooler parou de funcionar) e meu medidor de glicose (deu uma espécie de curto e ele não acusou mais nada). De uma hora para outra, fiquei sem comunicação e me veio um medo: e se eu tivesse um piripaque de uma hora para outra? Não poderia nem chamar um táxi. Felizmente, hoje comprei aparelhos novos e meu técnico veio trocar o cooler; a vida volta ao normal.

"Bus Stop", seu poema, é digno do filme de Marilyn (e Joshua Logan). Bonito mesmo. Hoje, fico por aqui. Não repare a brevidade (um bolinho muito gostoso que minha avó fazia), mas essa parafernália do fim de semana me deixou exausto, além de tenso. Quero dormir um pouco.

Beijo para Patrícia, forte abraço pra você, do seu velho Paulo 


 MARILYN/BUS STOP

https://youtu.be/mxJyklwVvxo


26.07.22

Meu caríssimo,

Bem que eu lhe disse no nosso almoço: compra um celular! Morando sozinho, você não se pode dar ao direito, o que quer que isso seja, de ficar ao vai-da-valsa, ao vento levou de coolers (que-que é isso?) & telefones fixos. Compre um celular, mesmo que só use em casos extremos como esses que aconteceram com você. Parece filme escrito pelo Stephen King! Sim, foi um grande prazer nosso reencontro. Escrevo também apressado: espero a Renatta, irmã da Patrícia, que vem me filmar para o vídeo do novo poema sobre La Monroe, que devo publicar ainda esta semana. Gostei muito de MM Além do Mito e de Love Happy (aliás, já conhecia a cena-relâmpago em que a MM aparece, mas não o filme dos Irmãos Marx).  Vou ver os outros dvds na sequência. Abração do amigão, Ronaldão

26.07.22

Ronaldim, meu amiguim,

É, você tem razão: um celular talvez seja a solução. Mas, se ele vier, precisarei pagar um curso intensivo para fazê-lo funcionar com todo o seu potencial. Sou um anarfa no assunto; certa vez tive um, mas pouco me serviu porque eu não sabia o que fazer com ele. Oba, poema novo sobre MM? Ora viva! Os dois filmes dela que você ainda não viu, pelo menos para mim não me parecem grande coisa. O primeiro deles é também o primeiro dela: "Scudda Hoo! Scudda Hay!" tem uma foto no documentário que você viu (MM e outra garota num barco preso ao cais), mas que foi eliminada do filme na sala de montagem. Existe a clara presença dela noutra cena que lhe descrevi, ela cumprimentando a amiga na porta de uma igreja. O outro, se não me engano, é o terceiro filme dela, feito na Columbia. A Fox a tinha dispensado após os dois primeiros filmes e, de repente, ela ganhou pela primeira vez o nome no elenco principal (mas não como primeira atriz). Ficou famosa e a Columbia refez os créditos: MM em "Ladies of the Chorus". Phil Karlson, o diretor, era um sujeito talentoso, e assim o filme não é ruim, acho.

 Abracim do velhinho, Paulo

 

28.07.22

Meu caríssimo amigo,

Sempre tomei muito líquido durante as refeições, apesar de criticado por minha mãe e outros parentes mais velhos. Sinto que, agora, isso não está me fazendo bem e é hora de parar. Fosse eu um sujeito de fibra mesmo, como já houve quem me chamasse assim, não precisaria ter esse tipo de problema. Bem, mas se ainda há tempo, vamos ser um pouco disciplinados. Sim, vou pensar seriamente na possibilidade de comprar um celular, desde que eu passe por um curso intensivo sobre como utilizá-lo minimamente. Quanto a coisas mais complexas, aí posso dar um tempo até chegar a hora. Como vai o novo poema para Marilyn? Vai sair em um novo livro seu de poemas? Quando conhecer os dois filmes dela que ainda não viu, gostaria de saber sua opinião. E se quiser outros dela, posso lhe conseguir, é só me dizer.

Abração do seu velho Paulo

 

28.07.22

Paulo, amigo querido,

Líquido nas refeições “é de lei”. Sempre tomei: antigamente, cerveja ou chope; mais antigamente, guaraná ou suco preparado pela mamã; depois, e quase sempre, coca-cola; hoje, vez por outra, uma taça de vinho. Como se vê, neca de água (coisa que todo médico que consulto me receita). Tome um comprimido de Domperidona meia-hora antes das refeições e o problema estomacal será amenizado ou, quem sabe?, até mesmo resolvido. Receita de Dom Werneck.

O poema da Marilyn está pronto, até já gravei para o vídeo que estou editando. Devo postar na segunda-feira, pois faltam alguns efeitos, umas fusões ou confusões. Vi Ladies of Chorus e devo aproveitar um ou outro fotograma na terceira (e última postagem) sobre MM, que devo fazer no dia 4 de agosto, data de sua morte. Agradeço a oferta de outros filmes dela: por enquanto, me dou por satisfeito pelo material que já tenho. Acabo de reler o livro do Mailer sobre ela (não sei o porquê, encontrei aqui em casa dois exemplares, os dois da primeira edição brasileira, by Civilização, 1973). Muita coisa interessante, outras pura birra com Artur Miller: deixa pra lá. Vou aproveitar algumas coisas do livro dele para a postagem sobre MM.

Et voilà! Vá lá: esse abraço, Werneckiano 2022


30.07.22

Caríssimo Dr. Werneck,

Quero, antes de mais nada, agradecer sua receita de Domperidona (parece nome de champanhe: "me vê uma Domperidona, safra 1982, bem gelada"), que usarei na primeira oportunidade. O fato é que acordei hoje sem os sintomas desagradáveis que vinha sentindo e passei um dia tranquilo. Estou muito curioso para conhecer seu novo poema sobre Marilyn. Ao meu lado, está o livro de Mailer, também da primeira edição brasileira (mas só tenho um exemplar). Você fez um breve comentário sobre ele e me deu vontade de reler alguns trechos. Grande parte dos filmes de MM não vale grande coisa, sobretudo os primeiros, mas aí vem "O Segredo das Joias" e me faz repensar essa opinião. Ou "A Malvada" (All About Eve), de Joseph L. Mankiewicz, que acho outra obra-prima. Ou os dois Hawks, "O Inventor da Mocidade" e "Os Homens Preferem as Louras" e, sobretudo os dois Billy Wilder, "O Pecado Mora ao Lado" e "Quanto Mais Quente, Melhor". Quer saber? Grandes diretores já estavam de olho nela desde que começou, acho.

Fiquem, você e Patrícia, com um fim de semana muito gostoso em Shangri-lá. com beijos e abraços para serem distribuídos comme il faut. Seu velho Paulo

 

30.07.22

Meu paciente amigo Augustus-Paulus,

Use Domperidona: funciona melhor que champanhe, garante daqui o Dr. Werneck. Veja que só de falar na “Dom” você já acordou melhor. Imagina quando efetivamente ingerir a dita cuja...

Sim, Sim, Sim: Marilyn, Marilyn, Marilyn!

Wilder & Hawks & Huston não devem ter escalado MM sem pensar. Muito menos Logan. Você cita Os Homens Preferem as Louras: Bingo! Fecho o vídeo-poema exatamente com uma cena de MM & Jane Russel cantando no filme de Hawks, as duas mais que maravilhosas.

Termino aqui, e rapidamente: corro para o GASAN (pode me chamar de Gabinete Sanitário), onde me aguardam o jornal do dia e alguns livros de ocasião. Subo depois pro Sangri para almoçar com a Patrícia. À noite, devemos ir ao Festival de Viola de Piacatuba. Aliás, eu estava lá quarta-feira e confesso que me emocionei quando a minha amiga, a cantora Thaylis Carneiro, que estava no palco com sua banda, a “Carmim”, fazendo homenagem a Minas e ao Clube da Esquina, de repente falou um poema do Drummond, aquele do “maior trem do mundo” e logo depois cantou várias músicas do Milton e emendou com um texto que eu escrevi sobre ele há exatos 50 anos (veja no link a seguir). “Fui” aplaudidíssimo (quer dizer, a Thaylis). Quando já ia embora, várias pessoas vieram me cumprimentar pelo meu “poema”. Confesso que chorei, o que parece letra de música.

Baitabraço, do Dr. Werneck

THAYLIS, MILTON & MEU POEMA

https://www.youtube.com/watch?v=JPUy4tI7C-E

 

02.08.22

Meu amigo RW,

Acabo de ler/ver seu belo poema para MM. Que linda homenagem! Após tantos anos sem ela, o tributo vem mais que em boa hora. Esquecê-la é esquecer uma fase importante da nossa vida, quando ela nos tomava pela mão e dizia "vamos ao cinema"! Vamos sonhar quando, felizes, a víamos na tela, mais real que a Guerra Fria que girava à nossa volta. Kruschev batendo o sapato na ONU não nos impressionava; MM nos resguardava do pesadelo. Era a própria personalização de um ideal, feminino, sofrido como suas personagens a quem, uma vez apresentados, nunca mais podíamos esquecer. Seu poema deixa isso claro: nele, MM está viva, tão viva como antes. Viva MM! Viva RW! A thing of beauty is a joy forever!

PAG

 

03.08.22

PAG, meu caríssimo,

Que coincidência você citar o verso de Keats que eu, Chico Cabral e um punhado de outros fiéis leitores (você inclusive) tanto admiramos. Veja a seguir o fragmento do poema Momento Vivo, não por acaso dedicado ao Chico Cabral, onde Keats ressurge em todo o seu brilho (apesar de minha modesta recriação). Publico amanhã, data de sua morte (há 60 anos), a última postagem sobre MM. Baita abraço, RW

quase agora 75 voltas

           em torno desse sol de si e sonho

                                    e toda eternidade já faísca

já na sombra de keats verso vivaz –

vivo um momento vivo morto-vivo –

grão de beleza essa alegria eterna

 

04.08.22

Meu caro PAG: mais Marilyn. Sempre Marilyn. Abração, RW

SESSENTA ANOS SEM

MARILYN MONROE

“Uma mulher tão sensível e com tanta vida, tão núbil quanto carne e tão evanescente quanto vapor“. – escreveu sobre Marilyn Monroe seu ex-marido, o dramaturgo Arthur Miller. Fernando Sabino sempre falava da máxima de seu pai: “No final tudo dá certo. Se não deu ainda é porque o final não chegou”. Lembro agora da máxima do pai do escritor ao finalizar essa série de postagens sobre Marilyn Monroe. Ao contrário do “The End” quase sempre feliz de seus filmes, na vida real as coisas não deram assim tão certo, nem mesmo em seu fim. Há exatos 60 anos, 04 de agosto de 1962, em condições ainda hoje misteriosas, a atriz era achada morta em sua casa de Los Angeles.

“É preciso encontrar a cabeça do prego, não apenas dar a martelada”– disse Marilyn em sua última entrevista à revista Life. “Mas que viagem todos os dias – registra o romancista Norman Mailer em seu Marilyn – A biography (New York, 1973) – ,“que viagem até a cabeça do prego! Que velhos campos minados pela emoção tinha de atravessar, navegando ao sabor de estimulantes do seu torpor químico para a sua consciência!”.

 

04.08.2022

Ronnie, meu amigo,

Seu texto/homenagem a MM está ótimo, tem que fazer parte do próximo Há Controvérsias. No caso, sem controvérsia alguma: ela marcou nossas vidas e, por isso mesmo, sobrevive viva, pelo menos até quando existirmos. Ou mesmo depois: creio que, nas novas gerações, muitos se sentiram tocados por ela. Abracíssimo, Paulo

06.08.22

PAG,

Sim, sim: Marilyn, Marilyn!!! MM marcará naturalmente presença no HC-3, se e quando vier. Abracíssimos, RW

10.08.22

PAG:

Com os devidos agradecimentos pelo “confete, confesso que chorei”, lembrado por você em outro email, marchinha carnavalesca de David Nasser que eu ouvia na voz de Francisco Alves na Cataguases de minha adolescência. Viva Milton & seus 80 anos! bs RW

 

10.08.22

RW,

Vejo que você foi um sucesso total em Piacatuba, alvíssaras! Assino embaixo do seu texto sobre Milton e afirmo que meu amigo Fernando Brant faria o mesmo. E comemorei o 80º aniversário de Caetano Veloso ouvindo a canção dele de que mais gosto, "Terra". Abracíssimo, PAG

 

10.08.22

PAG,

Não conheci pessoalmente o Fernando, mas sempre o admirei. Se você fala que ele assinaria embaixo isso só me faz sentir aquela pontinha de orgulho. Só uma pontinha, que mineiro não é dado a essas coisas. Terra é também uma das minhas canções do Caetano, ao lado de Força Estranha. Vi o show no domingo. Muito bom. Abração, RW

Com esse negócio de PAG pra lá (mas eu não pago) e RW pra cá, vamos acabar nos comunicando por telegramas.

21.09.22

Meu querido amigo Ronard (ou seria Godaldo?),

Seus textos sobre Jean-Luc, o mais antigo e esse novo, por ocasião do último ato de rebeldia dele, o suicídio assistido, são não só belos, mas também frutos de alguém que conhece bem esse cinema que encantou nossas vidas (especialmente "Pierrot, le Fou", destaque numa obra cheia de destaques). Me fizeram muito bem, pois acabo de atravessar novo período de hipoglicemias, que me deixou arrasado, principalmente por ter involuntariamente envolvido meus filhos, que já têm problemas mais que suficientes para enfrentar. A coisa chegou num nível tal que cheguei a pensar numa solução godardiana  para pôr fim à minha existência. Mário (Alves Coutinho) viu que eu falava sério e se empenhou para me demover da ideia. Competente como é, conseguiu.

Agora, envergonhado, creio que dei a volta por cima. E ler os seus dois textos certamente me ajudou a retomar o pique, pelo que lhe sou muito grato. Passado o tempo ruim, quis rever "Pierrot", sempre com prazer renovado diante de tantas novas descobertas que antes me haviam passado em branco. Ronaldo de Noronha disse que a obra godardiana continua mais que nunca viva; "portanto, ele não morreu". É vero, veríssimo. Que Patrícia (Franchini?) esteja muito bem, dê-lhe um beijo que mando, e que a vida prossiga, ainda com belas surpresas para nós todos.

Fique com o abraço forte que lhe manda o seu velho Paulo

 

21.09.22

Paulo Augusto, meu caríssimo

Fiquei/fico preocupado com essas “mazelas” que você andou passando. Mas “passando” é o tempo certo do verbo. Isso tudo vai passando, e deve. Ainda agora o Mário Alves mandou mensagem falando de minha postagem sobre Godard, e fiquei grato a ele: não por ter elogiado meu texto, mas por ter te ajudado num momento de crise. Pois é, amigo é para essas coisas. Espero que isso tudo já esteja passando e que a vida vai voltando ao normal. Palavras, palavras: mas sinceras. Sim, “a vida vai prosseguir, ainda com belas surpresas para nós todos”. Abração, meu amigo, Ronaldo

23.09.22

Caro Ronaldo,

As "mazelas" pelas quais passei realmente me deixaram mal, mas elas agora se encontram superadas. O que não quer dizer, absolutamente, que eu esteja "pronto pra outra". Não estou, creio que nunca estarei. A sensação de uma hipoglicemia, me parece, tem a ver com o sujeito que sai de casa, vira a esquina... e é surpreendido por um assaltante armado. Hoje me encontrei com Mário, tomamos um café e conversamos sobre meus percalços. Claro, falamos de você e seus poemas; somos seus amigos, mas nossas palmas nada têm a ver com amizade. É porque eles, os poemas, são mesmo muito bons. O mesmo eu digo dos dois que você mandou, que já conhecia, tendo lido seus livros. Antes eu havia brincado com a sua Patrícia e a de God-art (arte divina? Mesmo com minha falta de crença, creio que sim!), a Franchini. Também para mim, ouvi-la em "À Bout de Souffle", gritando pelos Champs Élysées "New York Herald Tribune!", é música. E a vida já está prosseguindo, e vamos com ela em frente! 

Abracíssimos para vocês, meus dois amigos, que lhes manda o velho Paulo

 

Paulo, meu querido

Você continua afiadíssimo (cinema) e afinadíssimo (música). Não é que não só se lembra do filme como também do tema assoviado por J.Wayne? Vou procurar no Youtube: lembro de ter gostando muito da música, bem mais que do filme, meio “B”. Vamos torcer pra liquidar a fatura no domingo. Patrícia manda um beijo e pede pra dizer que está dirigindo com grande desenvoltura. O problema é “enrolar a erva”. Com o braço engessado, precisa de ajuda (eu não entendo nada do riscado, que é o que se faz com o fósforo depois de enrolar o enrolado, se é que não estou me enrolando todo). Alguém ajudando (sempre tem alguém que entende do riscado), a coisa rola, os tapas idem. A vida continua a mesma. Meio enfumaçada, é bem verdade, mas a mesma.

Abração, Ronaldo

 

26.10.22

Ronaldo, amigo maior,

Muito feliz por ver que esse mal-entendido foi resolvido comme il faut. Não quero, a esta altura da vida, alimentar equívocos, sobretudo em relação a meus amigos queridos. Com que então Patrícia está em Itaipava? Com aquela irmã que eu conheci no Shangri-lá? Mas isso é ótimo, admiro sua atividade. Você aí, temporariamente sozinho na avenida Astolfo Dutra? Imagino que seja um tempo para boas leituras. Hoje, folheando "De Anchieta aos Concretistas", recolha de textos do grande Mário Faustino, na famosa seção "Poesia Experiência" do JB, dei com o nome do querido Chico Cabral em mais de uma página. Nos idos daqueles anos 50, devia ser mesmo um dos mais promissores poetas da nova geração brasileira.

Ando bem desatualizado: quais são os nomes das novas gerações de poetas cataguasenses? Estão eles agrupados em um mesmo movimento, como foi o caso do "Totem"? Confesso, não tenho mais qualquer referência sobre eles. E ri muito da letra da canção de Carlinhos Vergueiro (parceria sua?), em que ele usa menas. Tive um vizinho na minha adolescência que volta e meia usava essa "variante". Uma vez, tentei corrigi-lo, mas ele contra-argumentou: "menos é só para o masculino, sô! Se é feminino, então é menas, ora!". Vi que não adiantava insistir e me calei. Taco bom de verdade é o que eu costumava comer em um restaurante mexicano aqui em BH. Há muito não vou lá. Forte, saudoso e apertado abraço, Paulo

 

27.10.22

Paulíssimo, mon cher

“Sem ressentimentos”, como me disse o Fusco um dia (depois que “brigamos” pela entrevista do Pasquim). Amigos somos, e seremos forever. Sim, Patrícia continua da pá-virada. Ou do pé-virado, pois acaba de me dizer que torceu o pé jogando tênis em Itaipava. Chose de loque. Ela está lá com as duas irmãs (não me lembro qual você conheceu, talvez a Renatta, que mora aqui) e os filhos da Isabella, a outra irmã. Sim, sozinho na Av. Astolfo Dutra, mas com tempo somente para leituras de trabalho. Pesquisas sobre Augusto dos Anjos e modernismo: acabam de me “convocar” para uma palestra em Leopoldina sobre Augusto dos Anjos (que está enterrado lá) e os 100 anos da Semana de 22 (Augusto é considerado por parte da crítica, um pré-modernista, inclusive por Ferreira Gullar, que publicou em 1976 um excelente ensaio sobre ele). E também pesquisando para um (longo) ensaio sobre o modernismo em Cataguases: fui convidado a participar do e-Book “ALMA: Audiovisual, Literatura, Modernismo e Antropofagia”, que será editado ano que vem pela Universidade do Algarve (Portugal). Enfim: ufa!

Você me fala de Faustino e do Chico Cabral: os dois eram muito amigos, Chiquinho sempre me falava do Mário (ele me mostrou um dia os originais de seu livro Pedra de Sal todo cheio de comentários à margem, feitos pelo próprio Mário Faustino). Tenho tudo (acredito) o que os dois escreveram. Mas, não me lembro desse livro “De Anchieta aos Concretistas”. Está no “Poesia-Experiência” que foi editado pela Perspectiva? Ou foi uma edição à parte? Vou procurar.

Olha que não me lembro de ter lido essas menções ao Chico Cabral. Sim, vários “figurões” elogiaram os poemas de O Centauro (1949) do Chiquinho nos anos 50, de Drummond a Bandeira e ao “não menos” Guimarães Rosa. Eu ando em débito com meu grande amigo: sua sobrinha me enviou já há alguns meses uma caixa que trouxe do apartamento dele no Rio, com muita coisa que ainda não tive “ânimo” ou, na verdade, “coragem” de abrir pra ver o que há lá dentro. Talvez com medo de me emocionar com esse pequeno espólio de meu amigo Francisco Marcelo Cabral. Estou me desculpando, dizendo a mim mesmo que não “tenho tempo” para me deter nisso agora. Mas a verdade é que estou evitando a emoção. Mas dias desses tomo coragem.

As novas gerações de Cataguases? Sim, alguns nomes de peso, como meus amigos, o romancista Luiz Ruffato (que mora em São Paulo e é editado pela Companhia das Letras) e o meu xará, o poeta e excelente crítico Ronaldo Cagiano (atualmente morando em Lisboa). Mas não muitos outros, pelo menos não me lembro agora. Nada de movimentos. Não há mais movimentos: o pessoal agora ataca de per si, pelo menos em Cataguases. Sim, a música do Carlinhos Vergueiro é ótima. Chama-se “Procotolo”. A letra é dele, divertidíssima. Vai a seguir, com meu abraço apertado, Ronaldo

É o Procotolo/É a Cardeneta/É a Falcudade/É o Estaultuto/É o Fenônemo/É o Pogresso/E é sempre um Crima/E aí Vareia/E a Largatixa/ Que é o Pobrema/Esta é que é a Questã/Quanto Menas vezes falar dela/É melhor/Com Sastifação.

27.10.22

Paulo,

CATAGUASES NA MEMÓRIA

DE CLÁUDIO MURILO LEAL

Recebo mensagem de meu amigo, o poeta carioca Cláudio Murilo Leal (ensaísta e professor de grande relevo na literatura brasileira), ex-presidente da Academia Carioca de Letras, autor do belo prefácio para meu livro “Momento Vivo”. Um email emocionado, onde ele fala de seus tempos em Cataguases. Cláudio Murilo estudou no Colégio Cataguases no início da década de 1950, alguns anos antes de mim.

Merece transcrição:

“Estou no Bar do Ponto, Cataguases, 1951, vendo e ouvindo o Futuro, com Ronaldo Werneck. Saímos da sinuca, no térreo do hotel, em frente à praça. As moças andavam de braços dados na direção oposta à dos rapazes. Quando passavam por mim... eu piscava o olho esquerdo. Se elas rissem, nós sentávamos num banco de pedra com uma árvore de folhas namoradeiras filtrando o sol como uma sombrinha da minha avó Aída, mulher de meu avô, o poeta Leôncio Correia.

Roneck conta estórias do centro do mundo: Cataguases, Cataguases.

Aparecem Rosário Fusco, Humberto Mauro, Lina Tâmega da respeitosa família Peixoto, Joaquim Branco. São imagens, como as brancas velas de ontem que deslizam pelo rio Pomba.

Ronaldo escreve do seu Shangri-la... e nós, do lado de cá... temos saudades de Cataguases”. Cláudio Murilo Leal Por email, em 26.10.22

 

28.10.22

Ronaldo, amigão,

que bela mensagem, você tem toda razão. Foi ela motivada pelo seu recente livro sobre Cataguases, para o qual tive a honra de escrever a orelha? Pareceu-me que sim. Abracíssimo, Paulo A.

 

28.10.22

Ronaldo, meu caríssimo,

Nunca poderei pagar sua amizade; reafirmo, você é caríssimo. Sou e serei forever seu devedor. Patrícia é mesmo demais: jogar tênis, com o braço na tipoia?!? Que loucura, sô! Sim, a irmã dela que conheci foi a Renatta, pessoa adorável também. Tenho a obra completa do grande Augusto dos Anjos, prefaciada por um belíssimo ensaio de Ferreira Gullar sobre o poeta que jaz em Leopoldina. O nome correto do livro de Mário Faustino é "De Anchieta aos Concretos - Poesia Brasileira no Jornal" e foi editado em 2003 pela Companhia das Letras, com organização dos textos feita por Maria Eugenia Boaventura. Chico Cabral é citado mais de uma vez.

Há um segundo volume, que ainda não tenho, que é a continuação deste, por nome "Artesanatos de Poesia: Fontes e Correntes da Poesia Ocidental", outra recolha de textos do "Poesia-Experiência" dedicada aos autores estrangeiros. Também edição da Companhia das Letras, assim como meu exemplar de "O Homem e sua Hora". O "Poesia-Experiência" a que você se referiu, se bem me lembro, é edição da Perspectiva, que hoje encontra-se totalmente superada pelos dois volumes que mencionei, mais completos: cada um com mais de 500 páginas. Supere o receio e abra a caixa de Chico Cabral; boas surpresas deverão sair dela.

Luiz Ruffato e Ronaldo Cagiano são nomes que me são familiares; pensava eu em gerações posteriores. Você acabou por me confirmar o que eu já imaginava: é cada um por si e deus contra todos. A letra de Carlinhos Vergueiro é deliciosa. Me fez lembrar de um ex-colega de trabalho, que costumava dizer: quem tem um pobrema tem dois. Gostaria de acompanhar suas exposições sobre Augusto dos Anjos; podendo, por favor passe-me o acesso, nos dois casos. E fique, como sempre, com o forte abraço do seu velho Paulo

 

03.11.22

Paulo Augusto, amigão de toda hora

(o que me leva a “O Homem e sua Hora” do Faustino, de quem falo a seguir).

Remexendo em minha “estante Faustino”, que tem muita coisa, inclusive a 1ª edição de “O Homem e sua Hora”, publicada pela “Livros de Portugal” em 1955, que lembro ter comprado em 1963 na Livraria Padrão, Centro do Rio, onde Faustino havia lançado e único lugar que vendia a “preciosidade”. O livro está aqui em minhas mãos, intacto, cuidadosamente preservado.

E, não me lembrava,  o número  5 de “Invenção” a revista dos concretos, lançada após a morte de Faustino, com aquele belo e pungente poema que o Augusto de Campos lhe dedicou, “A Mário Faustino, aeromorto”, e o fecho fantástico (reproduzo sem o alinhamento original do poema): “mário mário/ mário multimário/ mário multitudimário/ carbonizado/ coração de guesa errante/ zombado pelo sol/ assado no aço/ TNTtorrado/ hecatombado/ braço/ que acusa o acaso”.  Logo a seguir, um texto como sempre exemplar de Benedito Nunes, “O Projeto Mário Faustino” e completando a homenagem, uma série de poemas de Faustino, tudo num total de 18 páginas, quase um terço da revista.

Aliás, esse número da Invenção tem um curiosidade: foi presente do Paulo Leminski, o próprio. E olha que nunca estive com ele. Deu-se (deu-se?) que a Adriana trabalhava na revista Manchete num época em que o Leminski andou por lá. Ele falou de poesia concreta com ela, e Adriana disse que o namorado (no caso, eu) gostava de poesia concreta e gostava muito de Mário Faustino. Leminski então sacou de sua mochila esse número de Invenção que tenho comigo e disse pra ela me entregar, pois tinha uma grande homenagem pro Faustino. Nunca vi o Leminski em minha vida, mas agradeço até hoje, pois esse é possivelmente o melhor número da revista.

Vários ensaios, várias traduções, vários e vários poemas dos concretos e até de “recém-chegados” como Manuel Bandeira (com aquele famoso poema “O nome em si”, em que ele faz uma espécie de decupagem dos nomes dos familiares de Gonçalves Dias, até fechar ao nome do poeta: “Ilmo e Exmo Sr. Augusto Gonçalves Dias/ Gonsalves Dias/ Dias Gonçalves/ Gonçalves Dias”. Logo a seguir, um poema de que gosto muito, de José Paulo Paes, “O suicídio ou Descartes às avessas”, curto e grosso: “cogito/ ergo/ pum”. Lembro que na época da faculdade fiz contato com Zé Paulo, pois queria fazer um curta com o poema, junto com alguns colegas. Ele adorou a ideia, aprovou de pronto. Mas acabou que deu em nada. Quem sabe, um dia...

Também reencontro o “Poesia Completa/Poesia Traduzida”, edição de 1985 da Max Limonad, São Paulo, organizada por Benedito Nunes, com introdução e notas dele próprio, o grande amigo e maior exegeta da obra de Mário. Uma edição que veio para ficar, pelo menos ficar em minha estante. Quando estava produzindo aquele meu cd Dentro & Fora da Melodia, falei com Benedito Nunes por telefone, que gentilmente me autorizou a usar poemas de Faustino em meu disco.  Mas muita coisa de minha coleção Faustino anda sumida.

De repente dou de cara com “De Anchieta aos Concretos”, edição referida por você, da Companhia das Letras. Havia me esquecido, a gente vai esquecendo vida afora. Não só não me lembrava como vejo que marquei várias passagens do livro, muita coisa quando ele se refere às minhas hoje saudosas amigas, Marly de Oliveira (que foi casada com o João Cabral) e Lélia Coelho Frota (que esteve aqui em Cataguases em 2003, junto com uma pá de poetas e amigos do Chico Cabral quando ele lançou o seu “Livro dos Poemas de Francisco Marcelo Cabral”). 

E, falar nele, vejo que marquei também as menções que Faustino faz sobre Chico Cabral, quando fala do Zé Lino Grunewald (p.419) e na Seção “O Poeta Novo” (pp 496/7) quando eu já marcara além do nome de Cabral, os de outros poetas meus amigos, como Cláudio Murilo (coincidência: é o mesmo Cláudio Murilo Leal que escreveu esse ótimo texto que publiquei há poucos dias e também o autor do prefácio de meu livro “Momento vivo”), Ivo Barroso e Roberto Menna Barreto.

Enfim, meu caro, eu havia me esquecido disso tudo, até mesmo que tinha o livro aqui em casa e o havia lido talvez atentamente. Não tanto, pois vejo que lá pelas tantas Faustino abre espaço para um “jovem poeta de 18 anos” chamado Carlos Diegues, com direito a publicação de um longo poema dele. Aqui entre nós, será o Cacá Diegues esse “jovem poeta”?

Falei do Zé Lino Grunewald, de quem o Chico Cabral foi amigo, e me lembrei que no livro “Pedras de toque da Poesia Brasileira” Zé Lino menciona vários e vários fragmentos de poemas do Chico Cabral, pedras de toque cabralinas. Falar no Zé Lino (que só conheci pessoalmente anos e anos depois, num lançamento do João Cabral no Rio), lembro-me que, ainda nos inícios dos anos 60, Joaquim e eu estávamos pensando em lançar um livro de poemas a quatro mãos. Entregamos os originais pro Chiquinho Cabral dar uma opinião e ele mandou pro Zé Lino.

Tempos depois, veio a resposta do Zé Lino: “Plenamente publicável em nível de consumo. Muito melhor que os lépidos e ledos ivos que andam por aí”. O livro não foi publicado, mas acabou servindo como embrião para meu primeiro livro e também para o do Joaquim. E vou ficando por aqui, que isso tá virando um “romance concreto”. Abração, Ronaldo

 

02.11.22

Meu caríssimo, respondendo com atraso:

Essa mensagem do Cláudio Murilo refere-se àquela minha postagem sobre o Shangri-lá, meu aniversário, Patrícia, sinuca & etc. Abração, R.

14.11.22

Paulo meu querido:

estou devendo resposta sobre Mário Faustino & caterva. É que estou numa semana de atropelo: a palestra sobre Augusto dos Anjos é na próxima sexta-feira e ainda não consegui alinhavar direito a coisa. Alinhavar (as linhas), palavra certa. Abraço, Ronaldo

A MORTE DE

GAL COSTA

Gal Costa foi velada nesta tarde em São Paulo. Inesperada, sua morte chocou fãs no Brasil e mundo afora. “A morte é da vida”, ela me disse numa entrevista que fiz há 50 anos, publicada em 22.03.72 nos jornais cariocas Correio da Manhã e Última Hora. Gal atropelara uma mulher na Rio-Bahia, que acabou falecendo: “Sabe, eu me considero uma boa pessoa e seria incapaz de matar alguém. Tenho absoluta consciência de que não tive culpa”.

Ainda traumatizada ela não queria dar entrevista para ninguém. Mas eu tinha um “certo crédito” com os baianos: entrevistara Gil recentemente e ele havia gostado do que escrevi. Assim foi que, autorizada pelo empresário Guilherme Araújo, Gal me recebeu num apartamento em Ipanema, vizinho à Lagoa. Presentes, além dela, sua mãe, Guilherme Araújo e o fotógrafo que levara comigo. Que não me deixou em paz durante todo o papo. Gal e eu nos sentamos num largo sofá, ela meio reclinada, a cabeça apoiada no encosto, ainda tensa, parecendo meio apertada dentro de uma calça de moletom. E ela falava, falava e falava, a voz – aquela agora triste voz de cristal! – saindo aos borbotões, como numa catarse.

Atrás de mim, o fotógrafo clicava e clicava enquanto me soprava ao ouvido: “Werneck, olha só, parece que ela está sem nada debaixo do moletom”. Ele soprava tão alto que Gal naturalmente escutou e eu, constrangido, fiz ouvido de mercador ao tempo em que ela continuava a falar, como se não tivesse escutado o aloprado fotógrafo. Nunca mais me esqueci desse bastidor de nossa entrevista.

Havia levado comigo o poema que fizera para Gal há alguns anos. Mas o lance desastrado do fotógrafo me deixou meio sem graça e acabou que me esqueci. O poema seria publicado em meu primeiro livro, “Selva Selvaggia”, e também iria compor mais tarde uma das faixas de meu cd “Dentro & Fora da Melodia”. Chama-se “Tropegal Canto para Gal Costa” e ela nunca o viu, acredito. Eu o reproduzo agora em meu blog, junto com a entrevista feita com Gal naquele 22 de março de 1972. Ainda há pouco, a voz de Gal surgiu assim do nada no cd-player de meu carro: “Minha sereia é rainha do mar/ Minha sereia é rainha do mar/ O canto dela faz admirar/ O canto dela faz admirar”. Gal cantando Caymmi é para sempre e para sempre o canto dela faz admirar.

Vejam no meu blog, link a seguir, a entrevista e o poema Tropegal Canto para Gal Costa. Saravá, Gal! Você é minha sereia e é moça bonita. Minha sereia e moça bonita nas ondas do mar onde você habita.

Link para o blog: Há Controvérsias: GAL HÁ 50 ANOS: A MORTE É DA VIDA (ronaldowerneck.blogspot.com)

 

14.11.22

Paulo.

Acontece no momento a primeira edição da FLICA – Festa Literária de Cataguases, evento idealizado por Marco Andrade – vice-prefeito do município e também seu secretário de Cultura – e realizado em parceria com a FLIP–Festa Literária Internacional de Paraty. Entre as várias atividades do evento, que está movimentando a cidade, houve na noite do último dia 10, quinta-feira, no Centro Cultural Sicoob, uma roda de conversa intitulada “Os desafios da palavra escrita em Cataguases”.

Casa cheia, participamos eu e o escritor cataguasense Marcos Vinícius Ferreira de Oliveira. Minha fala restringiu-se ao campo da poesia, quando entre menções a vários poetas e ensaístas – João Cabral, Mallarmé, Maiakovski, Mário e Oswald de Andrade, Verlaine – citei o erudito quinhentista Rodolphus Agricola, lembrado por Ezra Pound no “ABC of Reading”: “nos escrevemos para ensinar, comover, deleitar”.

Reproduzo agora no meu blog minha fala na roda de conversa da FLICA. Vejam no link a seguir Há Controvérsias: POESIA PARA ENSINAR, COMOVER, DELEITAR (ronaldowerneck.blogspot.com)


16.11.22

Ronaldo caríssimo,

Respondo aqui suas duas mensagens, com alguma rapidez porque a semana anda muito apertada. Mas não quero deixar passar muito tempo. Claro que, como você, lamento a morte de Gal, cantora excepcional que tive a chance de ver ao vivo num show emocionante. Mas gostei em especial de suas colocações sobre a poesia e o ato poético. Terminei de ler "O Homem e sua Hora" e a poesia de Mário Faustino é impactante, embora não esteja no nível dos maiores mestres. Mas encontrei um texto assinado por Noé Filho (quem seria?), surpreendente, que vai abaixo. O grande Bandeira, certamente cansado das ressalvas críticas que Faustino lhe fazia, e também a Drummond, Cecília Meirelles e outros medalhões (Faustino não livrava a cara de ninguém), deu o troco, em barra pesada. Leia:

“Mário Faustino, poeta piauiense, era gay e teve o dissabor de receber essa poesia do Manuel Bandeira: Mário Faustino, és de veras./ E se és, Faustino, veado,/ Bem poderás ser chamado/ Pelos a quem dás ou deras/ Ou darás, Faustino amado,/ Mário veado de veras!.

Se você não conhecia esse poema bandeiriano, fique surpreso: eu me surpreendi muito. Abraços grandes, também a Patrícia, Paulo

 

17.11.22

Mon Dieu de la France!

È vero? Quem é esse Noé Filho (da puta, ou do ancestral homem da barcarola?). Será que o Bandeira deu mesmo essa Bandeira? Estou acá a duvidar...

Escrevo mais e mais tarde, assim que me livrar do (já imenso) texto que vou ler amanhã em Leopoldina sobre Augusto dos Anjos e o Modernismo. Ronaldo

23.11.22

Paulo Augusto, carissimo mio,

Segue em anexo, para conhecimento de vosmicê, o texto de minha palestra “Augusto dos Anjos e o Modernismo”, realizada em 18.11.22 em Leopoldina, no Conservatório Estadual de Música Lia Salgado, durante o evento Semana Augusto dos Anjos. Baita abraço, com direito a beijo que Patrícia (agora sem tipoia) está enviando, Ronaldo

 

25.11.22

Caro Ronaldíssimo,

Ótimo que dois acadêmicos de João Pessoa (melhor que isso, só os do Salgueiro, hi, hi, hi!) estiveram em Leopoldina e diante da qualidade do seu texto, irão publicá-lo no Correio das Artes, que não conheço, mas deve, sim, ser muito bom e importante, já que abonado por você. Sua palestra foi ótima. Faço apenas uma ressalva: pareceu-me mais uma fala sobre o Modernismo que sobre Augusto dos Anjos – ele que, quando muito, pode ser definido como pré-modernista. Foi dos primeiros poetas brasileiros que li e continuo tendo muito respeito por sua obra. Retribua a Patrícia o beijo que me manda e fique você, amigão com meu grande abraço. Paulo 

30.11.22

Meu caríssimo Eduardo Galeano,

Respondo aqui seus dois textos. Além do uruguaio, você também tem o conhecimento, a prática e o talento necessários para escrever sobre futebol. Os que você me mandou, o poema inclusive, me fazem desejar (esperar?) um livro seu todo sobre o esporte bretão. Você me diz que esse goleiro é titular da seleção; só vou saber mais é quando eu chutar, apud Gonzaguinha em "Geraldinos e Arquibaldos". Radinho contando direito a vitória do meu tricolor, diz Chico Buarque. Na sua lista de goal-keepers, estranhei a ausência de Castilho, que não tinha todos os dedos de uma das mãos, mas era capaz de façanhas homéricas ao defender o seu Fluminense (não, nunca fui tricolor). Em Minas, goleiro para mim era Jardel, o Cavaleiro Negro (vestia-se sempre de preto) do meu América (no qual jogou também Neneca, que cheguei a entrevistar para uma matéria saída na "Manchete" dos Bloch). Ou o velho Kafunga, do Atlético, que conheci quando, já aposentado, quis se candidatar a um cargo de vereador e também bateu à minha porta na "Manchete". Perdeu. Enfim, bons tempos aqueles. Abraço grande e palmas da arquibancada, Paulo

30.11.2022

Meu caríssimo Dom José Cavaca

(agradecendo desde já pelo “Eduardo Galeano”),

Sim, faltou o Castilho, a famosa “leiteria” do Castilho. Nessa época “castilhar” eu era Flamengo doente (hoje nem tanto: com pena do Pablo, Flu doente, acabo sendo “Flamengo quase Fluminense”, que vira-casaca sempre fui). Então, flamenguista, meu “goleiro” era o Garcia, que atuava naquele time tricampeão carioca (53/54/55): Garcia, Tomires e Pavão; Jadir, Dequinha e Jordan; Joel, Rubens, Índio, Benitez (depois Evaristo, depois Dida) e Esquerdinha (depois Babá). Nunca vi o Garcia pessoalmente, mas o Rubens, o famoso “Dotô Rubis”, que batia faltas como ninguém e fez vários gols de falta no Barbosa, o próprio, aquele do escrete de 1950, aquele do gol do Gighia comentado pelo Ademir na minha crônica, pois é, o Rubens eu encontrava sempre na hora do almoço, centro do Rio, rua da Alfândega: ele era “apontador” de jogo de bicho, veja o destino do craque.  Dos goleiros que você aponta, dos “seus” goleiros, nunca ouvi falar. Mas acredito que tenham sido grandes. Então você é América? Conto uma coisa, um dos meus treinadores aqui em Cataguases, o Wilson, meio-campista extraordinário, acabou jogando (e bem) no América aí de BH. Wilson era uma figuraça. Nos treinos, quando eu pegava a bola com as mãos para passar pros companheiros, ele gritava de lá: “Rapimente, Ronaldo, rapimente”. Quer dizer, eu devia passar mais rápido que rapidamente. Devia passar “rapimente”. Nunca mais me esqueci. Então, vou “rapimente” me despedindo com o abraço de sempre, Ronaldo

17.12.22

Meu caro Ronaldo,

Tenho andado sumido, sei. Venho enfrentando um problema danado com a minha dentição; dois (!) dentes falsos meus caíram e tiveram que ser repostos. Mas o que parecia um problema de fácil solução acabou se revelando um inferno, pois minha base óssea não tem mais sustentação. Terei que me submeter a uma operação (será em janeiro, após as festas de fim de ano) para este novo implante. Daí meu sumiço. Aproveito um momento mais tranquilo para também lhe desejar e a Patrícia, mais a família, um Natal e Ano Novo muito bons e alegres, cheios de belas surpresas. Que 2023 seja muito, muito melhor que este ano que chega ao fim. Tudo indica que será, sem o presidente Bozo. Abração do Paulinho Boca de Cantor (torta, desafinada)

17.12.2022

Paulo, meu Paulinho boca de Cantor,

Aguenta firme, que isso passa. Entre a dor e o nada, prefiro o nada, pois a dor já é um compromisso, disse Godard, devidamente acossado, invertendo a máxima de Faulkner. Fico com Faulkner: a dor ainda é vida e compromisso; o nada, nada mesmo. Também já passei pelos (vários) implantes dessa vida. Eles me deram outra “segurança dentária”. Implante os implantes e a vida vai melhorar. É o que desejo, junto (dijunto, em baianês) com os melhores votos de Feliz Natal, Boas Festas, etc & tal. Patrícia manda beijos, yo también, Ronaldo

19.12.22

Ronaldo, meu amigão,

Eu e minha boca... Lembrei-me de uma crônica engraçadíssima do querido Stanislaw Ponte Preta, na qual ele imaginava a criação do Dia da Sinceridade, em que as pessoas só falariam aquilo que realmente pensam. E dá um exemplo: uma senhora ia a uma sapataria para comprar um sapato de couro de camelo. Era atendida pelo vendedor que, diante do modelo escolhido, emendava de primeira: madame, não vai nessa. Esse camelo nasceu cavalo e o sapato entorta mais que boca de cantor de tango (a minha, hi, hi, hi...). No que a mulher retrucava, dando um dinheiro ao sujeito ajoelhado à sua frente: vá a um dentista, nego. Daqui de cima é que se tem uma ideia panorâmica das suas cáries. Vinha logo a tréplica: a senhora não quer examinar a nossa coleção de ferraduras? E Stanislaw concluía: grande ideia, amigos, o Dia da Sinceridade. Um senhor humorista, o nosso Sérgio Porto. Bem, já estou me acostumando à ideia de uma operação bucal assim que entre o Ano Novo, para os devidos implantes. Enquanto isso, curtam bem as festas, com o que elas têm de bom. Beijos e abraços do Paulo A.

23.12.2022

Caríssimo Paulão, amigo de sempre,

Stanislaw sempre hilário. Faz falta. Seus problemas dentais (que serão resolvidos “sem problemas”, você verá) me levam ao também hilário conto “A Dentadura” do Chico Peixoto, que está no seu livro “A janela”, e que eu comentei no meu livro sobre Cataguases, com o subtítulo “Viver com dentaduras integrais é muito perigoso”. Há que rir, mesmo com dentaduras integrais. Há que rir, como me lembra minha amiga, a jornalista Maria Lucia Rangel, filha do grande Lúcio e mulher do crítico Sérgio Augusto. Maria Lucia acaba de me mandar seu livro “Vinicius por Vinicius”, com uma série de frases de Vinicius pinçadas por ela em vários jornais e livros. Algumas hilárias, como: O problema de São Paulo é que a gente anda, anda e nunca chega a Ipanema”. Ou “O difícil é separar. Casar é facílimo”.

Meu amigo e parceiro Carlinhos Vergueiro dizia que eu devia ter conhecido o também seu parceiro Vinicius, pelo menos para papear sobre casamentos. Eu perdi a conta dos meus, mas acho que “não faria feio” perto dos do Vinicius. Ou ainda “Acho que os poetas servem para não serem presidentes da República”. Bingo! O livro da Maria Lucia é muito bom e li de uma enfiada só. Vinicius também faz falta, e como!

Grande abraço natalino & Boas Festas com dentes novos e altaneiros, o que quer isso signifique. É o que desejamos, Patrícia e eu, junto com os nossos beijabraços, Ronaldo

 

23.12.22

Ronaldo, amigo querido,

Preparo-me para passar um Natal solitário; os filhos têm, cada um, compromissos nas casas de família de seus/suas consortes. Eu, com azar, abrirei um vinho e talvez veja alguma coisa na tevê, não sei bem ainda o que. Ou releia "A Dentadura", boa ideia você me deu. Você me fala na filha de Lúcio Rangel, parente de Sérgio Porto, e me trouxe à memória aquela famosa história verídica do encontro de Lúcio com Mário de Andrade, na avenida Rio Branco. Talvez você conheça o caso, mas não custa relembrar. Mário, felicíssimo, cruza com o amigo e diz: "Mas que ótimo, Lúcio, você é a segunda pessoa importante que eu encontro hoje! Sabe quem eu acabei de cumprimentar? O Ismael Silva!" Para espanto de Mário, Lúcio responde: "Não conheço esse Ismael". "Como não conhece, Lúcio!? O fundador da primeira escola de samba do Rio, o compositor de clássicos como 'Se você jurar'! O grande Ismael Silva!" Só então Lúcio abre um sorriso: "Ah, este eu conheço: o grande Ismael Silva!" Vinicius era um frasista de mão cheia e o livro de Maria Lúcia deve mesmo ser muito interessante. Como também gosto do livro de Sérgio Augusto sobre a chanchada, "Este Mundo é um Pandeiro".

 Que você e Patrícia passem um Natal muito alegre e em paz e que as festas de fim de ano sejam um prenúncio de novos tempos para o Brasil que se liberta da praga bolsonarista. Abraços e beijos para vocês, lembranças aos familiares e amigos! Paulo

 

25.12.2022

Paulo

É noite de Natal, Natal mesmo, dia 25, e respondo a você, meu caríssimo, para dizer que também meus filhos estão longe: Pablo no Rio e Ulla mais longe ainda: acaba de chegar de férias a Luxemburgo, vê de pode? Na noite de ontem, passei o Natal na casa de minha irmã, enquanto a Patrícia ficou lá no Shangri com o pai dela. Quer dizer, também eu passei sozinho. Só que não reli A Dentadura. Mas quase quebrei os dentes de tanto mastigar as delícias (sempre) de antanho na casa que foi dos meus pais e onde passei boa parte da infância e adolescência. Tudo regado a um vinho e recordações, essa recordações que me assolam sempre que volto à casa da Rua Dr. Sobral, 101. Um bom vinho: e nisso nós dois estivemos juntos, se é que você abriu o seu aí em BH.

Ótima a história do Lúcio com Mário de Andrade. Ismael realmente foi grande: “Se você jurar” me emociona sempre que ouço. Vou passar essa história pra Maria Lúcia, filha do Lúcio, talvez ela não conheça. Sérgio Augusto é um dos grandes críticos de cinema que temos, e “Esse Mundo é um Pandeiro” (tenho até hoje a primeira edição, com o impagável Oscarito na capa) um livro que às vezes releio. Sérgio é de uma memória inacreditável e lembra-se de coisas do arco da velha, daqueles tampos em que a velha ainda tinha arco.

Então, meu caríssimo, só pra dizer que dei uma parada numa crônica que estou escrevendo para o Cataguases para te responder. Sim, volto a escrever a partir de janeiro no famigerado hebdomadário (epa!), onde comecei a publicar minhas crônicas sob o óbvio pseudônimo de Roneck em 1962. Nossa, há 60 anos! E fico por aqui, que pra lá, para a crônica, devo voltar. Aliás, o título dessa crônica inicial será “Feliz é quem volta”. Ou vota. E não é?

Patrícia, quase dormindo, manda um beijo. Eu, um forte e natalino abraço,

Ronaldo

26.12.22

Ronaldíssimo, meu caro,

Se na tal noite de Natal, ou seja, de 24 para 25, como sempre foi costume em minha família, eu tive por companhia somente um vinho saboroso, o almoço do dia 25 foi marcado por um reencontro com a família, no apartamento de minha ex Patrícia. Festa, alegria (em especial das crianças), foi tudo ótimo. Até minha filha Elena inventar de me servir um kir royale, esta mistura francesa de creme de cassis e champanhe. Deliciosa, a tal ponto que exagerei no número de doses e acabei apagando, hi, hi, hi... Felizmente, não por muito tempo: um dos meus netos me acordou, chamando-me de novo ao convívio geral.

Que ótimo saber que você retorna às páginas do "Cataguases" (onde surgiu todo o "Totem", não é?): isto quer dizer que, em breve, teremos o "Há Controvérsias 3", ótimo! Maria Lúcia com certeza conhece a história do pai com Mário de Andrade. Sérgio Augusto foi amigo de Veloso, mas eu não o conheço pessoalmente; sei que ele, além do livro sobre a chanchada, escreveu um outro chamado (creio) "Lado B", que não conheço.

Para Patrícia, um beijo, mas não a acorde; espere ela se levantar. Para você, um abraço do tamanho dum bonde, como se dizia na minha infância. Paulo

 

27.12.2022

Paulo, meu natalino amigo,

Sim, eu digo sim, como a Molly Bloom do Joyce: imagino as delícias do kir royale preparado pela Elena, delícia das delícias. Tomei uma vez, eu que agora só bebo vinho, e gostei “deveras”, como gostei não das “Veras”, mas sim da Vera-Verinha, minha paixão primária, pois minha coleguinha no curso primário, e minha amiga até hoje. É bom se embriagar de quando em quando e apagar sonhando com a festa, a alegria das crianças, a família reunida, o Natal & coisa & loisa.

Retorno dia 1º de janeiro ao Cataguases (infelizmente não mais impresso, agora só virtual: o papel anda caro, é o que dizem), não mais sob a égide (égide? Fica assim: é a primeira e última vez que uso a palavra neste 2022) do “Há Controvérsias”, pois segundo os editores a coluna passa a se chamar “Ideias”. Que seja, mas as futuras crônicas irão sim, espero, se somar a outras para um possível “Há Controvérsias 3”. Esta de agora terá o título de “Feliz é quem volta”, eu que volto a escrever no Cataguases, onde comecei em 1962 (há 60 anos!) sob o pseudônimo óbvio de “Roneck”. Sim, foi no Cataguases que Joaquim e eu editamos nossos suplementos literários, encartes que começaram com o SLD/Suplemento Literatura Difusão (que um cataguasense daqueles gozadores natos apelidou de “São Loucuras Deles”) e desaguaram no Totem.

Vou repassar para Maria Lucia a história do Lúcio/Mário de Andrade/Ismael, o Grande. Aliás, envio em anexo (pra você ler quando tiver tempo, pois é quase um romance) as observações que escrevi e mandei pra ela sobre o Vinicius por Vinicius, que ela havia me enviado. Maria Lucia acaba de me mandar mensagem sobre meu texto: “Emocionante seu texto. Li o livro do Humberto sobre Jayme Ovalle. Adoro. Ovalle era amigo do meu pai. Rosário Fusco era outra paixão do Lucio”. Eram duas referências que estavam no texto que escrevi sobre o livro dela, a Jayme Ovalle e ao nosso Humberto Werneck.

Além de dizer que seu pai (o “Lucio”) gostava de Rosário Fusco. Disso eu sei e sou “testemunha ocular”: certa feita o Fusco me pediu para entregar um bilhete pro Lúcio, que morava no Jardim de Alah (antes do filme do David Neves). Dito e feito. E muito bem feito, pois acabei de certa forma amigo do grande Lúcio Rangel, também eu. Lembro que volta e meia nos encontrávamos no final de tarde num barzinho de Ipanema, “um de seus pontos”, pra tomar uns uísques, que é o que fica dessa vida. Sim, Grande Lúcio, papo formidável: sabia de tudo, conhecia todo mundo.

Não sabia que o Sérgio Augusto foi amigo do Veloso (sinto até hoje falta do Geraldo, de sua memória formidável, de sua amizade). Também não conheço esse livro dele, “Lado B”. Volta e meia Maria Lucia me envia textos que o Sérgio publica no Estadão, sempre ótimos, bem informados, cultos.  

Como hoje é outro dia, sempre outro dia, Patrícia já acordou e já subiu pro Shangri com a Clara (você conheceu a Clara, a nossa dálmata?), que adora se esbaldar nos quintais dessa vida.

Devolvo o abraço, esse meu que não é do tamanho de um bonde, mas de um trem, aquele do Erasmo, do “Pode vir quente que estou fervendo”, pois “meu coração é do tamanho de um trem”. Aliás, acho que essa música é do Carlos Imperial, não estou certo. Mas como o Imperial roubava músicas de todo mundo (a ponto de dizer que era dele a canção do nosso folclore “Meu limão, meu limoeiro”), fica sendo do Erasmo, um dos que se foram neste ano, que acaba de levar a Nélida Piñon.

Então, meu caríssimo, abraço grande, do tamanho de um trem, Ronaldo

 

2023

31.01.23

Roneck, caríssimo,

Sei da importância do "Cataguases" desde os tempos de Mauro, quando Paulo Emílio pesquisou nos arquivos do jornal para seu livro-tese. E me lembro das páginas do "Totem", quando aí estive para fazer meu "Verdes Anos". Você e Joaquim devem mesmo ser os colaboradores mais antigos do jornal e isso é ótimo: ver que continuam a pleno vapor. Quanta gente boa já passou pelas páginas da – com o perdão pelas palavras – honorável publicação. A página que vocês fizeram está ótima, como sempre. Vejo você municiando seu "Há Controvérsias 3", maravilha! Abraços e beijos para você e Patrícia, Paulo

03.02.23

Gratíssimo, meu querido amigo.

Por mim, pelo Joaquim e pelo Cataguases, essa “honorável publicação”.

Sim: Há Controvérsias 3 em marcha. Patrícia manda beijo, eu um baita abraço,

Ronaldo

 

14.03.23

Ronaldo, velho amigo,

Viva Joaquim, de livro novo. Que venham novidades dele e também suas. Vocês dois são o meu ponto de referência de Cataguases. Dos novíssimos, não conheço ninguém, hélas! Estou a ler um dos últimos livros de Sérgio Sant'Anna, antes que a covid desse cabo dele. Como escrevia contos belíssimos! Abração, beijo para Patrícia, do velho Paulo.

 

10.03.2023

Paulo Augusto, meu caro

Mandei sua mensagem pro Joaquim, que ficou todo pimpão com suas palavras. Eu também, por que não? No meu livro sobre Cataguases, que você não só escreveu o ótimo texto das orelhas como me fez a honra de sua presença no lançamento aqui às margens do Sena, epa!, do Pomba, há menções (do Ruffato, do Cagiano) sobre alguns dos novos escritores daqui. Na revista eletrônica Chicos (enviei alguns números pra você, lembra?) há sempre poemas e colaborações dos “novos de Cataguases”, que essa terra não para de produzir letrados e iletrados, bien sûr. “Os novos de Cataguases”: lembrei-me agora do título de uma reportagem de página dupla publicada pelo velho Suplemento do Minas em 1968, tempos do Murilo Rubião. Era esse o título de uma matéria, com direito a fotos e os cambaus, com o Joaquim, o Pedro e comigo mesmo, ora pois! Lembrei-me agora: o Afonso Borges estava procurando por você, perguntou se alguém tinha o seu contato no grupo de Whatsapp “Literatura em Minas” de que participo. Quando ia responder enviando seu contato, alguém, não me lembro quem, já havia passado o seu contato. O Afonso falou com você? Se não, tenho contato dele, posso passar. Patrícia está também toda “pimpona”: comprou um “stand pedal” e vai todo fim de semana para a represa da usina para “navegar”. Leva sempre a Clara a bombordo. No último fim de semana, a Bete Martins esteve aqui (está vendo locações para o filme sobre a Maria Alcina que vai rodar este ano) e fomos todos pra usina. Eu inté naveguei com a Patrícia. A estibordo, claro! Abraço grande, meu amigo, Ronaldo

 

19.03.23

Ronaldo, meu amigo,

Acho que não fui de todo exato. Tenho lido, sim, Cagiano, Ruffato e outros, mas você e Joaquim continuam sendo referenciais. "Verdes Anos" e as amizades daí nascidas viraram marcos para mim, e eu sou fiel a isso. E mesmo a tribo da qual então me aproximei já está desfalcada, Pedro e Aquiles deixam isso claro. Outros sumiram; exemplo, Márcia Carrano, cadê ela? Se o remédio não é tocar um tango argentino, deve pelo menos ser um prometido jogo de sinuca no Shangri-lá! Há muito que não falo com Afonso Borges, nem ele fez contato recente. Tenho sabido dele por entrevistas que ele faz em programa de televisão e que às vezes dou sorte de ver. Fico imaginando o que ele quer comigo; é um bom sujeito, de quem já estive mais próximo, quando era o dono de uma livraria na Savassi. Esse "stand-pedal" que Patrícia comprou é aquilo que me acostumei a chamar de "pedalinho", para a gente navegar docemente sobre as águas? Em caso positivo, viva ela, ainda mais com a Clara a tiracolo. Por aqui, Mário segue promovendo a separação de Jeanne, acho que já comentei sobre isso. Chamou o advogado dele para acertar a partilha de bens e eles já definiram que irão vender o belo apartamento no qual residem. Mário vai se mudar para um lugar menor, para onde levará sua biblioteca que irá ocupar um bom espaço. Com que então Maria Alcina vai virar filme? Ela, me parece, anda meio sumida da mídia – ou é só impressão minha? Como não tenho perdido tempo com essa música recente brasileira, que me parece de uma pobreza franciscana, pode ser que eu esteja entendendo tudo errado. Para você ter uma ideia, só há pouco li o "Rodin" de Rilke, feliz por ver um poeta falando bonito de outro grande. Grande, saudoso abraço (também a Patrícia) do seu velho Paulo

 

23.03.2023

Caro Augustissimus Paulus,

Pois é, a tribo vai sendo aos poucos desfalcada. Pedro e Aquiles e também Plínio Filho, ótimo poeta dos tempos do SLD, morto há alguns anos. Márcia Carrano continua em Juiz de Fora, às vezes nos falamos pelo WhatsApp, esse troço que você não tem, mas que facilita a vida adoidado. Tempos modernos, o que quer que isso signifique. Sim, o jogo de sinuca no Shangri-lá, mais que prometido, está de pé (afinal, não podemos jogar sentados). Vamos marca essa efeméride. Não conheço Afonso Borges pessoalmente, só de raras trocas de mensagens pela internet e de informações vagas sobre “Sempre um Papo”. Então ele não fez contato recente com você? Engraçado. Como disse, ele perguntou por você no tal grupo do zap Literatura em Minas (também participo, junto com vários amigos): pensei que tivesse feito contato... O stand-pedal da Patrícia não é o “pedalinho”, mas uma espécie de prancha de surf, onde o/a “atleta” fique de pé (daí o “stand”) e rema rio afora. É mais complicado, portanto, exige mais esforço e a Patrícia está se saindo uma “stand-pedalista” de primeira. Com a Clara a tiracolo e tudo o mais. Então Mário está se separando da Jeanne? Pena. Separação é sempre difícil, uma barra (a gente sabe disso, né mesmo?). Pois é, a Maria Alcina vai virar filme dirigido pela Bete Martins. Sou amigo da Alcina até hoje, desde os longínquos tempos dos Festivais de Cataguases anos 169/70 (ela foi melhor intérprete nos dois). Estou ajudando Bete no que posso. A Alcina esteve aqui há umas semanas, a Bete estudando locação e algumas roupas e enquadramentos. Acabei participando, cheguei mesmo a improvisar uma dança com a Alcina, filmada pela Bete, uma curtição de velhos amigos. Alcina tem feito alguns trabalhos interessantes em São Paulo, meio à margem da mídia, e gravou um show que virou documentário exibido pela Canal Curta (Você tem esse canal de TV? É muito interessante, um dos melhores, junto com o Art1). O nome? “De normal bastam os outros”, nome de uma música do Arnaldo Antunes, que ela gravou. No documentário ela canta com muitos convidados, inclusive o Ney Matrogrosso. Há também uma música que o Zeca Baleiro fez para ela, muito legal.  E para não dizer que também estou entendendo tudo errado, até hoje não li o Rodin do Rilke, veja só! Mas tenho um trunfo na manga: em recente viagem pré-pandemia Patrícia e eu estivemos em Tours, na França, e visitamos o Museu Balzac (o gajo nasceu lá), onde há a famosa escultura que Rodin fez do mestre Honoré, aquele que colocou a dama trintona dentro da Comédia Humana. Abraços, abraços e os laços de nossa para sempre amizade, Roneck Wernaldo

26.03.23

Meu amigo Ronaldo,

Ora viva Patrícia grande remadora, que bom que ela encontrou boa maneira de se divertir. Sei de sua amizade com Maria Alcina e bom que ela seja agora objeto de um documentário longo sobre sua carreira. Sim, costumo ver o canal Curta, vou prestar atenção ao "De Normal Bastam os Outros" para vê-lo na primeira oportunidade. Afonso Borges não deu sinal de vida, provavelmente deve ter deixado o contato para outra oportunidade. O que tenho feito é ler os contos completos de Clarice Lispector, por cuja obra tenho uma admiração sem tamanho. Há coisas sublimes, para não falar da belíssima mulher que ela também era. E vejo que você está muito sintonizado com Rodin, como seria de se esperar. Não sei se cheguei a conhecer Plínio Filho, quando fui fazer o "Verdes Anos", minha memória vem me pregando algumas peças. Mas, independente disso, vamos combinar nossa sinuca para a primeira oportunidade: pretexto para nos revermos, o que sempre me deixa feliz. Seu amigo constante e fraterno, que também quer o melhor para Patrícia, Paulo  

29.03.2023

Paulo, meu caro amigo,

Às vezes, ficar sem internet é lucro: a gente se volta com mais ardor para nossos livros, que são tantos. Sim, Patrícia é, com o perdão da palavra, “exímia” remadora. O documentário sobre Alcina, na verdade um longa, está indo aos poucos. Vale a pena ver, se você conseguir (acho que vi no “Curta”, não sei ao certo), o documentário “De Normal bastam os outros”. Pois é, não sei o que houve com o Afonso, que andou te procurando mas não fez contato. Ainda nesta segunda-feira eu vi o Afonso no programa Roda Viva, entrevistando uma sua (dele) amiga, uma escritora aí de BH, que naturalmente já esqueci o nome, ô idade, sô! E olha que ela me pareceu interessante, tem um romance chamado qualquer coisa como “... rio” (sei que tem a palavra rio, mas não me lembro do resto), premiadíssimo. Ela também tem uma agência de publicidade famosa (pelo que entendi) aí em BH. Por esses dados amalucados será que deu pra você saber quem é ela? Clarice, pois é, você sabe da minha aversão/fascínio por ela, explicitado naquele meu texto para o catálogo da exposição sobre ela no CCBB dos anos 1990 (está no Controvérsias 2). Acredito que você não chegou a conhecer o Plínio Filho, pois na ocasião ele já morava no Rio e ia muito raramente a Cataguases. Foi um literalmente grande (quase metro e noventa) poeta. Pena sua morte. Vamos combinar nossa sinuca, mas um pouco mais à frente: vou com a Patrícia pra Salvador no final de abril pra ver o show do Chico Buarque (que não consegui ver até hoje) e comemorar o aniversário dela em terras baianas no dia 2 de maio. Ficamos por lá por uns 10 dias, por aí. Quando voltarmos, vamos marcar sua vinda, assim que possível. Mandei ainda há pouco uma postagem sobre o Juca Chaves, que morreu no último sábado. Não sei se você recebeu. Juca era um grande frasista, além de ótimo compositor de modinhas. Às vezes, seu cantar me lembrava o de João Gilberto. Abração, Ronaldo

31.03.23

Ronaldo, querido amigo,

Não sei o que me acontece: ando numa velocidade de tartaruga para responder os e-mails que me chegam. Já deveria ter escrito a você e, mais uma vez, peço-lhe desculpas. Sendo "muito original", antes tarde que nunca, não é? Então, vamos lá. Começo falando de Afonso Borges. A escritora, amiga dele, que você o viu entrevistando, é Carla Madeira. Dita uma best-seller, autora de um livro chamado "Tudo é Rio", que não conheço. Mas minha amiga Duda me deu "Véspera", o terceiro romance dela, cobrindo-o de elogios. Este, eu li, mas achei decepcionante – e aí quem ficou decepcionada comigo foi Duda, paciência. Sei da tal agência de publicidade de Carla, pau para toda obra e atualmente na crista da onda. Mas prefiro manter distância dela. Se necessário, na Ilha da Madeira.

Que inveja (boa!) tenho de Patrícia e seus dons náuticos. Os meus se assemelham aos de um prego, direto pro fundo. Que vocês curtam juntos o próximo aniversário dela, desde já lhe mando um grande beijo de felicidades e um ótimo show de Chico Buarque em Salvador. Não tenho visto coisa alguma, não me animei a enfrentar "A Última Sessão de Música" de Milton Nascimento e, menos ainda, o fim do Skank, do qual nunca fui admirador. Vi, sim, várias vezes Juca Chaves em BH, que sempre fazia enorme sucesso junto às plateias de então. Num primeiro momento, eu ria de suas sátiras e achava românticas suas modinhas, mas o tempo foi passando e minha admiração foi decrescendo até chegar ao nível atual, algo próximo do pobre, lamento dizer. Mas sempre ficou o respeito por um artista múltiplo e sobretudo bem sucedido, que escolheu viver afastado do oba-oba em Salvador.

Estive ontem com Mário (Alves Coutinho) e Ronaldo de Noronha no nosso encontro semanal para um café. E pra que, Ronaldo, foi você falar de seus textos sobre Clarice no "Há Controvérsias 2"? Lá fui eu "dar uma olhada"... e assunto puxa assunto! Saí dessa "olhada" umas duas horas depois. Clarice puxa Fernando Pessoa, duas paixões minhas, com licença. Ambos me levam à Bossa Nova, daí a Lúcio Alves, daí a Mário (Alves Coutinho) e seu livro sobre Godard e daí a...

Tive que dar uma gravata na minha vontade e berrar: CHEGA!!!, senão não saio hoje! Ô livro danado de gostoso, sô! Sei que há quem seja contra versos, está aí aquela figura patética que infelizmente voltou ao Brasil, após três meses de Estados Unidos, gente que seja contra a criação, pois prefere a destruição. Mas não creio em controvérsias: quem crê e ama esta mesma criação só pode admirar o que vem de você, meu amigo. Muito, muito obrigado! Abraços e beijos para você e Patrícia, queridos! Paulo

 

01.04.2023

Paulo, meu cauro,

Afonso Borges: neca de pitibiribas. Voltei a mandar mensagem pra ele sobre você. Não responde, ou não respondeu até agora. Sim, a best-seller chama-se Carla Madeira. Achei a moça meio pedante. Pelo que vi (e não li), você deve ter razão em não ter gostando romance dela. E manter distância da moça na Ilha da Madeira, é ótimo! Sim, Salvador nos espera no fim deste mês, já que é 1º de abril há cerca de hora e meia. Lembranças inesquecíveis daquele aziago dia de 1964. Quando os milicos querem dizer que a “revolução” foi em 31 de março. Na verdade, o golpe foi mesmo em 1º de abril, que eles esconderam a vida inteira, afinal é o dia da mentira...

Se eu disser que gosto-não-gosto do Milton Nascimento você vai achar que estou snobando o Bituca. Mas é verdade. Só vi um show dele na vida: “Milagre dos Peixes”, no Municipal de São Paulo, anos 70. É que a Adriana era assessora de imprensa do Benil Santos, empresário do Milton e de vários outros, vamos dizer, expoentes da MPB. Adriana era a assessora, mas era eu quem fazia os textos de divulgação. Então, fomos a São Paulo a trabalho. Mas deixa o Milton pra lá (confesso que me emociono até hoje com Travessia e principalmente com aquela gravação dele com o Chico, de “O que será”). Do Skank, passo longe: nunca me interessei. Juca Chaves: gosto-não-gosto. Tinha umas piadas legais, outras simplesmente deploráveis. Mas sua voz sempre me lembrou muito João Gilberto (será que estou pirando de vez?). 

Me alegra você gostar do Controvérsias 2 e peço perdão por ter feito você “perder” duas horas na releitura de meu livro. Mudei de planos: penso em publicar, no lugar do Controvérsias 3, um livro chamado “Que falta fazem” (título provisório), reunindo as várias crônicas escritas nos últimos anos sobre artistas de que gostava e amigos de que gostava ainda mais: Do Godard ao Fellini, do Baden à Gal, da Flau ao Afonsinho, ao Chico Cabral & etc etc. Nos últimos tempos parece que venho me especializando em obituários, virando o rei do necrológios. Ave! Não vou falar do idiota que voltou ontem dos States. Ele não merece ser mencionado. Bem, meu amigo, vou ficando por aqui, que já vem raiando a madrugada, ou quase. Baita abraço, Ronaldo

 

02.04.23

Roniquito, my dear,

Melhor deixar Afonso Borges em paz. Ele não se interessa mais, eu não estou preocupado. Se algum dia quiser voltar ao assunto, a gente se fala. Já Carla, é madeira de dar em doido; Ela que continue escrevendo seus romances, que dificilmente lerei. Não vi "O Milagre dos Peixes", vi apenas um show de Milton aqui em Beagá, muito bom. "Travessia" e "Itamarandiba", entre outras, são obras-primas, ambas parcerias com meu amigo Fernando, de quem muitas vezes nem se fala. E foi um poeta de primeira água. Juca Chaves dizia que "Presidente Bossa Nova" é anterior até mesmo à Bossa Nova propriamente dita, no que estava certo. A música dele é de qualquer coisa como 1956, enquanto o movimento musical surge em 1959. A voz dele até que lembrava a de João Gilberto, mas o som dele era diferente. Mário segue seu caminho; ontem me ligou e conversamos sobre o nada. Percebi claramente que necessitava de um apoio e, claro, eu o dei. Darei, sempre que precisar.

Mas como "perder" duas horas com o "Há Controvérsias 2"? Voltar a um livro bom é sempre motivo de grande alegria. Que fala de tantos temas altamente interessantes, assim como se conversasse com um amigo. Esta, creio, é a função da crônica. Se assim não for, vira uma chatura crônica. "Que Falta Fazem" é um muito bom título, o perigo é virar um obituário de mão única. Buñuel dizia que anotava em um caderninho os nomes dos amigos que iam partindo, até que um dia foi surpreendido pela presença de alguém cujo nome havia erroneamente listado. Patrícia já retornou de sua viagem à irmã? É hora de começar a preparar a viagem a Salvador, ora!

Super-abraço do seu velho Paulo

 

04.04.2023

Paulo, Paulete Goddard (assim mesmo, com dois Ds: nome de um travesti que conheci na noite de Copacabana, o que, evidentemente não é o seu caso), mon cher ami.

Vamos pensar no Borges, o outro, o legítimo argentino, e esquecer o Afonso. Carla, Madeira de dar em doido: grande sacada.  Também não me interessei pela moça, pelo que a ouvi falar. Milton (Nascimento) andou dormindo lá em casa. Parece nome de peça teatral, mas é verdade. Quando eu morava com dois bateristas no famigerado Edifício 200 de Copacabana vários músicos aportavam por lá antes de irem para as boates onde tocavam à noite. Milton aportou na época que apresentou Travessia naquele Festival. Também o Wagner Tizo, esse sim: ficou dois meses lá em casa quando era pianista de boates na noite carioca.  Fernando Brant, que infelizmente não conheci, era um grande poeta-letrista, autor de várias obras-primas (primas ou irmãs?).

“Que falta fazem”, já que aprovado por vosmicê, será então o título do livro de crônicas-obituários, coisa em que estou me especializando. Naturalmente, com a ajuda (que pecado!) dos amigos que se vão, que estão indo... pra onde, meu Zeus? Essa história do Buñuel me lembra uma outra, verídica, que aconteceu com um jornal francês, acho que L´Express. Todos os jornais têm o hábito de ir preparando os obituários de personagens famosos que estão para bater as botas, ou quase. Facilita na hora do vamos ver: a matéria já está praticamente pronta. Pois bem, acontece que certo dia o L´Éxpress deu em letras garrafais a morte de uma atriz famosa (Catherine Deneuve? Jeanne Moreau?), que estava vivíssima à época. Ela, Deneuve, Moreau?, não se fez de rogada. Escreveu para o jornal dizendo que estava feliz com o seu próprio obituário, com a gentileza com que foi tratada. E que gostaria mesmo de ter morrido, só pra não estragar a notícia. Et voilà!

Abracíssimos, Ronaldean  

 

05.04.23 – 2

Caríssimo Wernaldo,

Paulette Goddard? Poxa, nunca havia descido tão baixo, hi, hi, hi... Uma traveca? Meu amigo Fernando Fonseca certa vez quis montar uma livraria na Savassi e sugeriram a ele o nome de Livraria da Traveca... De suas notícias, lamento o acidente com Patrícia, que danificou o carro dela. Imagino que vocês tenham viajado para a Páscoa no Rio a bordo do seu carro e que logo ela possa usar de novo o dela, devidamente recuperado. Abraço do Paulo.

05.04.23

Paulinho querido:

Não leve a mal o “Paulette Goddard”, pura brincadeira (de mau gosto, reconheço). Paulette, na verdade, homenageava com seu pseudônimo (era Paulo José, eu acho) a ex-mulher do Chaplin e protagonista de “E o vento levou”, de quem era fã. Era um showman (man?) engraçado, tragicômico, com tiradas muito inteligentes, que apresentava com rara verve os shows da Boate Erótika no Baixo Copa. Tudo em meio à profusão de mulatas e strips girls, onde também durante certo tempo eu me encontrava, “pesquisando” para meu livro “Doris Day by Night”. Há no livro um poema dedicado à/ao Paulette “La nuit c´est moi”. Anos depois da “pesquisa”, eu tive a “subida honra” de lançar o livro na Erótika, apresentado com todos os louros (& louras) pela própria Paulette. Vida de artista, sô! Vou amanhã pro Rio com a Patrícia. Ficamos de ir ao teatro com a Ulla na sexta, ver uma peça (qual?) do Antonio Fagundes que ela escolheu. Se a filha escolhe, papai aceita. Abraço forte, Ronaldo

 

09.0423

Ronaldo, meu caro,

Vi que não conseguiria escrever para você antes de sua viagem ao Rio. Preferi, então, pegá-lo na sua volta, esperando que tudo tenha corrido às mil maravilhas e que Ulla já esteja boa da pneumonia, assim como meu neto Henrique também já se encontra melhor. Gostou da peça com Antonio Fagundes? E a Páscoa em si correu como esperado? Espero que sim. Por aqui, poucas novidades, a não ser um filme de e com Clint Eastwood, que meu amigo Ronaldo de Noronha me emprestou: "Menina de Ouro" (Million Dollar Baby), que não conhecia, e do qual gostei muito. No mais, apenas um contato com meus netos por motivos pascais. Wagner Tiso tem razão: viver neste (i)mundo não é fácil. E já estou chegando ao fim dos contos de Clarice; empolgado como estou, penso em me dedicar, em seguida, às cartas e crônicas dela: dois tijolaços que a Rocco lançou, um para cada item. Ou, quem sabe, ler um livro editado pela Funalfa sobre João Carriço, pioneiro do cine-jornalismo de Juiz de Fora, que documentou fartamente a vida da cidade. Já ficou pronto o carro de Patrícia? Que ela o receba em estado de novo. Enfim, bem vindo de volta à casa! Para você e Patrícia, o abraço saudoso do seu, Paulo 

13.04.23

Amigo Paulo,

Sim, foi tudo bem no Rio. Ulla está melhor (e seu neto também: boa notícia). A peça com o Fagundes foi uma decepção. Fraquinha que só ela. De resto, ótimo fim de semana: almoçamos com minha querida amiga, a cantora Neti Szpilman, e no outro dia houve um almoço de Páscoa na casa do Pablo. Não conheço esse filme do Clint Eastwood, mas gosto de alguns de seus filmes. Invejo você nessa empreitada clariceana: às vezes penso que fico devendo um mergulho mais cuidadosa na obra dela. Mas deixo sempre pra depois. Tenho notícias de João Carriço por alguns amigos de Juiz de Fora ligados ao cinema. Nada mais profundo. Enfim, é isso (fora uma gripe que está me tirando do sério). O carro da Patrícia fica pronto amanhã: ufa! Enquanto isso ela vai usando o meu, já que estou de molho em casa. Isso aí, meu caro: sem muitas novidades no front. Abração, Ronaldo

21.04.2023

Ronaldo, meu caro,

Consegui, desta vez, abrir seus arquivos que, segundo o meu todo-poderoso computador, tinham ido parar no seu lixo. De onde ele tirou isso, não faço a mínima ideia. Mas não encontrei nada que não tivesse lido antes. Como lhe disse, continuo sabendo muito pouco de sua amiga Maria Alcina, até pelo menos que eu veja o filme que está sendo rodado sobre ela. Terminei foi de ler um livro com cartas, diários e até pequenas peças literárias de Franz Schubert, um dos compositores que mais admiro. E a seguir? Como já lhe disse uma vez, gosto de variar. Se saio de uma biografia, pego uma ficção; se largo um ensaio, quero encarar algo novo. Então, o que escolhi? Revisitar os poemas de "Noite Americana: Doris Day by Night", e estou me deliciando. Falar nisso: você tem um livro do Fellini, que se chama "A Arte da Visão"? Possuo  dois exemplares e, se não tiver, ficarei feliz em lhe enviar minha duplicata, já que é um autor que você ama.

Aproveito este feriado para fazer uma limpeza na minha estante; já separei uma pilha de coisas inúteis para levar a um sebo. Minha diarista, um ser humano da melhor qualidade, diabética como eu, vem me telefonando diariamente desde que tive uma última hipoglicemia que me deixou mal. Cheia de cuidados ("não estou incomodando o senhor"? Claro que não, Cláudia. "Já tomou o café da manhã bem reforçado? Almoçou na hora certa? Fez um lanche entre as refeições"?), ela não se esquece. E eu fico muito sensibilizado com sua atenção. Quanto a você, poeta, está melhor da gripe? Aqui, a não ser uma pancada ocasional, o tempo vem se mantendo mais ou menos uniforme. E acompanho, com algum espanto, a eleição de Heloísa Buarque de Hollanda (não creio que haja parentesco) para a ABL. Não conheço uma única obra dela que não seja bem menor. Enfim, nesta área há muito perdi as ilusões. Abraços a você e Patrícia, do seu amigo de todas as horas, Paulo

      

27.04.23 – 1

Paulo Augusto, meu querido

Com o (in)devido atraso respondo ao seu último email. E já quase dormindo, eu que agora estou dormindo mais cedo, logo eu que atravessava as noites escrevendo ou em noitadas (o que também era uma forma de escrever). Mas já é quase meia-noite e acordo cedo amanhã, quando Patrícia e eu vamos para o Rio: nosso voo pra Salvador é na manhã da próxima sexta-feira. 

Vou te mandar algumas coisas da Maria Alcina mais à frente. Eu gosto, gosto muito. Afinal, amigo é pra essas coisas como já disse o grande Aldir Blanc. Nada sei de Schubert, ignorante que sou. Mas esse tal de “Noite Americana” é um livro de que já ouvi falar (rsrsrs...). Às vezes até bem. Não, meu caro, não tenho esse livro do Fellini, “A Arte da Visão”, nem dele nunca ouvi falar. Como disse, ignorante que sou. Vou adorar receber o livro: só você mesmo pra me fazer tal gentileza.

Sempre bom ter uma diarista como a Cláudia, que se preocupa com seu café da manhã, seu almoço & etc. Tem toda a razão em ficar sensibilizado. Eu tive uma pessoa assim/ que cuidava da casa e de mim. Ficou mais de 20 anos comigo a Solange, desde que voltei pra Cataguases. Passou por alguns de meus casamentos (“a gente não tem cura”: evoé, Chico & Caetano!). Pois é, meu amigo, a Solange nos deixou (a mim, à Patrícia e a seus dois filhos e uma neta) logo no início da Covid, num tempo ainda sem vacina. Foi súbita e extremamente dolorosa pra todos nós a sua morte.

Isso aí. Sim, a gripe passou: faz tanto tempo que nem me lembrava mais. Semana passada tomei a vacina contra a gripe (a quinta da Covid, a Polivalente,  tomei já há alguns dias). Nem me fale da Heloísa Buarque, com aquele equívoco que foi a edição de “26 poetas hoje”, onde poucos dos que ali estavam eram na verdade poetas. Sua eleição foi um equívoco. Eu a conheço pessoalmente. Chegou a se interessar pela edição do meu livro sobre Humberto Mauro: ela, na época, tinha uma editora, a “Aeroplano” (não sei se ainda existe). Eu fiz contato quando estava com o livro praticamente pronto Mas acabei preferindo a Artepaubrasil, que tinha um potencial de distribuição praticamente imbatível para uma editora de médio porte: encontrei meu livro do Mauro em várias livrarias, em várias cidades: Rio, São Paulo, aí em BH, e até em Salvador. Ainda de uma das últimas vezes em que lá estive, 2016, fui ao atual Cine Glauber Rocha (na minha época, quando morei na Bahia, era o Cine Guarany) pra ver um filme do Walter Lima Jr, sobre  o Rogério Duarte, uma das figuras de ponta do tropicalismo (é autor de muitas das letras das canções do inicio do movimento), que aliás fez também o cartaz de Deus & o Diabo.  Merece mudar, e mudo, de parágrafo.

Pensei que o filme fosse do Walter Lima, esse, que conheci pessoalmente no Rio há muitos anos, ainda nos anos 60, apresentado pelo Waltinho Carvalho, e depois nos reencontramos aqui em Cataguases quando do Cineport. Pois é, o Walter Lima de tantos filmes do Cinema Novo, inclusive A Lira do Delírio, que adoro. Já que estou no embalo, vou contar rapidamente um outro encontro com o Walter Lima, uma outra vez que o vi, mas não reconheci, meio embriagados que estávamos. Eu havia escrito o roteiro de um filme (“O Rei da Voz”) junto com o Hélber Rangel e em função disso volta e meia saíamos juntos e encontrávamos várias figuras do cinema que circulavam pelo Rio de Janeiro da época, início dos anos 80. Uma noite, numa roda de chope e cinema, começamos a listar os filmes brasileiros de que mais gostávamos. Eu havia acabado de ver A Lira do Delírio e indiquei logo o filme como o meu preferido da ocasião.

Um sujeito que estava do meu lado (e que não reconheci na hora, juro) virou-se pra mim e disse: “Você está me gozando?”. Não entendi e perguntei o porquê. O gajo virou-se e disse: “Sou o Walter Lima Jr., diretor do filme”. Caímos todos na gargalhada e continuamos com o chope até a madrugada vir chegando. Walter Lima estava acompanhado da mulher, a cantora Telma Costa (irmã da Suely), que havia feito o contracanto (junto com Chico Buarque) da música “Eu te amo”, gravada para o filme do Jabor. Pois é, acabei levando os dois pra casa (eu estava de carro). Eles me disseram que moravam na Lagoa. Pois bem, dirigi pra lá. E em lá chegando, pergunto a eles qual era a rua onde moravam. Adivinha se sabiam! Passamos por uma rua, por outra e nada (“Ronaldo, nós mudamos essa semana, e não estamos identificando a nossa rua!”). Fui um custo pra conseguirmos achar a rua. Thelma morreria logo depois, tão nova, uma pena, voz maravilhosa. Mais uma mulher que o Walter Lima perdia, ele que perdera a Anecy, irmã do Glauber, e estrela de A Lira do Delírio, há não muito tempo.

Mas voltemos ao Cine Glauber e ao filme do Walter Lima. Não é que o Walter Lima que dirigia o filme sobre Rogério Duarte era outro? Minha confusão deveu-se a eu ligar o Walter Lima Jr, já ele que foi assistente de Glauber em Deus & o Diabo, cujo cartaz foi feito pelo Rogério Duarte (muitas coincidências!), como sendo o realizador do filme. Pois, “o outro” sentou-se do meu lado e da Patrícia durante a projeção e me disse ser um documentarista baiano e que todo mundo fazia confusão com o nome dele. Mas o filme valeu a pena, muito bem feito, com cenas hilárias do Rogério Duarte (outras trágicas, quando de sua prisão na época da ditadura) e suas teorias fantásticas, quase surrealistas.

Rogério acabara de morrer naquela semana, e o Walter Lima (o outro, o baiano) conseguira um depoimento do Caetano que foi ouvido na ocasião. A triste voz do Caetano falando do amigo emocionou toda a plateia que lotava o cinema. Rogério é um nome a ser estudado, ficou meio esquecido. Mas, ah sim, perdi o fio da meada. E o reencontro agora: o Cine Glauber Rocha (nem sei se ainda funciona: vou ver quando chegar agora em Salvador) tem/tinha uma cafeteria e uma livraria especializada em cinema. Advinha o que encontrei? Bingo! O meu livro sobre Humberto Mauro. Realmente a distribuição da Artepaubrasil é muito boa.

Mas já ia mandando o tradicional abraço pra você quando lembrei de um fato que me deixou particularmente feliz esta noite. Acabo de saber (que orgulho!) que meu filho Pablo, que é Diretor de Negócios da empresa paulista Skymail Soluções em Nuvem (embora morando no Rio), acaba de fazer uma palestra em São Paulo na ERP, o maior evento da América Latina sobre Software e Gestão. Pablo falou sobre “Os Desafios de solução de nuvem para os sistemas de negócios”. O que quer que isso seja me deixa literalmente de boca aberta, eu que mal consigo usar o computador e muitas vezes me utilizo até hoje dele como se fosse uma máquina de escrever “um pouco” mais sofisticada...

Pois é, Paulo Augusto, logo o Pablo, el señor dom Pablito, como o chamei no poema a ele dedicado quando tinha meros quatro anos. Lembrei agora de um vídeo que fiz em 1988. Era domingo de Carnaval e fizemos algumas cenas de rua, algumas hilárias, com personagens folclóricos do Carnaval, e depois fomos pra casa do meu amigo, o ator Luiz Linhares, em Astolfo Dutra. Passamos por um lixão, onde havia alguns meninos da roça, meio esfarrapados. Gravamos a cena, depois coloquei a voz do ator Eduardo Dascar falando um poema meu, “Aguarde sua vez” (que deu título ao vídeo). Na casa do Luiz, gravei o poema que fiz pro Pablo quando ele tinha quatro anos (com direito a “interpretação” do próprio, sem jeito que só ele), que abre com uma citação de uma música do Zé Ramalho, “Frevo Mulher”. Por que essa música? É que quando da infância de Ulla e Pablo, os dois cantavam essa música todinha (é imensa!) para meu total espanto (eles tinham aí por volta de quatro anos, o Pablo; e oito, a Ulla). Na edição, lembrei que tinha uma cena em Super 8 dos dois cantando a música pendurados no portão da casa do papai aqui em Cataguases. O Super 8 não tinha som: coloquei na edição, na voz da Amelinha. Isso tudo só pra dizer que acabo de rever o vídeo “Aguarde sua vez” e sinceramente, me emocionei ao ver Pablo e Ulla tão jovens, tão meninos. Tô ficando velho, meu velho.

Envio a seguir o link para o vídeo, pra você ver quando tiver tempo (são 25 minutos). https://www.youtube.com/watch?v=BAxU178QBew

Mandei outro dia email com uma resenha do livro que recebi do Braz Chediak. Você recebeu? Conhece o gajo?

Já é uma da matina. Ufa! Abracíssimos de buenas noches, Ronaldo    

27.04.23

Amigo Ronaldo,

Ontem participei de homenagem a nosso amigo Veloso, promovida pela Prefeitura de BH. Aconteceu no ex-cine Santa Tereza, hoje administrado pela municipalidade, cuja sala de exibições foi batizada como "Sala Geraldo Veloso". Do Rio, vieram sua viúva Bete e a filha Jacira das Flores, que ele sempre chamou de Petite. Eu, o filho caçula Lourenço (que mora em BH) e Victor de Almeida falamos sobre sua variada atividade de trabalho, como ativista político e artístico e também, claro, grande cineasta que foi. Depois, um bate-papo com a plateia, infelizmente reduzida.

Cheguei de volta perto de onze da noite, mas pensando em responder ao seu ótimo e-mail, antes que vocês viajem. Espero que ainda haja tempo. Ontem, cansado, só pensei em dormir cedo. Vão passar muito tempo em Salvador? Regressando, faça contato! Hoje, como de costume, irei me encontrar com Mário (que deu uma palestra na UFMG sobre "Heart of Darkness" de Joseph Conrad, tendo sido muito aplaudido) e Ronaldo de Noronha, três últimos mosqueteiros de uma geração que vai chegando ao fim. Vou providenciar o envio do livro de Fellini a você; na minha confusão costumeira, procuro onde anotei, sem me lembrar, dos números de seu endereço na avenida Astolfo Dutra. Podendo, me confirme. Aproveitem ao máximo a temporada baiana e o dengo que a terra tem. Boa viagem, beijos e abraços! Paulo 

 

27.04.23

Meu caríssimo: apressadamente, que já estamos de partida.

 Bacana homenagem pro Veloso: mais que merecida. Volta e meia topo com o nome dele em algum filme ou documentário brasileiro na tevê. Sim, soube da palestra do Mário e, lembrei-me agora, hoje é dia do encontro semanal de vocês (abraços pra ele e pro Noronha, que não conheço ainda). Ficamos em Salvador até o dia 7de maio. Dia 8, ê Minas, estamos de volta à base. Meu endereço: Av. Astolfo Dutra, 600 apto 301 – 36770-001 – Cataguases MG. Vou adorar receber o livro do Fellini. Abraços apressados, Ronaldo

 

04.05.2023

Ronaldo, querido amigo,

Um texto seu que abre com uma linda foto de Patrícia, embalada pelo sol da Bahia, não pode esperar uma resposta por muito tempo. Escrevo-lhe para lhe dizer que postei hoje, para seu endereço em Cataguases, um exemplar de "A Arte da Visão" de Fellini. Não é um texto muito longo, mas que aborda, filme por filme, a obra dele. No Correio, me disseram que deve demorar uns cinco dias (!!!) para chegar à sua porta. Espantado pelo prazo longo, levei um tempo até entender que vocês moram fora de Minas, hi, hi, hi, que nem Chico Peixoto, que dizia que morava em Cataguases, fora de Cataguases...

Como você me disse que volta daí no próximo dia 7, acho que não está de todo mal. Hoje foi também o dia de tomar um café com Mário e Ronaldo de Noronha e conversarmos um pouco sobre as coisas deste país maluco, começando com o tal Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do nosso ex-presidente, que teria falsificado a caderneta de vacina de Boçalnaro. Não achem que as coisas estão correndo tranquilas: há gente da extrema-direita, jornalistas inclusive, botando fogo pelas ventas contra Alexandre de Moraes e outros que ousam investir contra o ex-presidente que, estamos agora sabendo, abriu as portas para que um número enorme de brasileiros se armasse, permitindo o acesso desse material a grupos de marginais  e milícias. A coisa absolutamente não está sob controle.

Não vou me estender mais até porque amanhã terei que levantar cedo para procurar um presente para meu neto mais velho, Henrique, que fará sete anos no sábado e já me convidou para sua festa. Só lhe digo mais é que não vi o poema que você dedicou a Patrícia, não encontrei anexo algum a acessar. Claro, podendo você depois me manda, quero muito lê-lo. Bom proveito neste resto de temporada baiana, bom regresso e abraços grandes até o próximo contato. Paulo

 

13.05.23

Paulo Augusto, meu amigo

Chegamos da Bahia há quase uma semana e ainda não consegui sair de casa: “dor de doer” nos costados, na lombar e nos cambaus. Praticamente de cama até ontem, quando fui ao médico. Medicado e com a ajuda de uma fisioterapeuta, dei uma melhorada e a dor vai passando aos poucos. Sim, meu caro, como já disse repetidas vezes “Cataguases é uma cidade do exterior mineiro”. Nada mais justo que as entregas pelo Correio demorem. Mas “Arte da visão” de Fellini já está em minhas mãos e já na fila de leitura (tenho três ou quatro livros de amigos, também recém-chegados: pra ler e dar pelo menos uma palavra sobre eles).

Dei uma passada no livro do Fellini e encontro as fotos feitas por meu quase xará Paul Ronald no set de 8 ½. São fotos que já conhecia, vistas numa exposição sobre 8 ½ realizada há alguns anos pelo Hernani Heffner no MAM, sobre a qual escrevi um texto publicado pela revista eletrônica portuguesa “A viagem dos argonautas”.  

O poema para a Patrícia está logo na postagem mais recente de meu blog: https://ronaldowerneck.blogspot.com/2023/04/do-i-love-you-yes-yes-i-do.html

Na véspera de sairmos da Bahia, escrevi dois “modestos” haicais (veja no anexo). Como disse meu amigo, o também crítico de cinema Carlos Alberto Mattos, “a Bahia me inspira, me pira”.

Sete vivas e muitos mais ao seu neto Henrique, pelo aniversário e pela festa. Confesso que tenho inveja desses encontros belorizontinos dos três mosqueteiros: Mário, Ronaldo e você. Quem sabe um dia não se junta a vocês outro Ronaldo, este “D´Artagnan” que aqui prestidigita?

Boçalnaro cada vez mais enrolado com seus ajudantes de ordens & afins, todos talvez mais enrolados que o próprio. Cadeia neles.

“Fellini é uma das pessoas mais inteligentes e sensíveis entre as que, hoje, desenvolvem uma atividade criativa”, escreveu Ítalo Calvino no texto “A arte da visão”, de 1985, texto reproduzido na abertura do livro que você me enviou. Cada vez gosto mais de Ítalo Calvino, cada vez sinto que preciso ler mais tudo que escreveu. Ele e Fellini eram muito amigos e aquela cena inesquecível de Teo, o tio do personagem Titta (alter ego de Fellini) em Amarcord, aquela em que do alto de uma árvore, ensandecido, começa a gritar “io voglio una dona!”, é na verdade tirada de uma passagem do romance “O Barão na Árvores”, de 1955. Leia sobre isso o que escreve o crítico literário André Nigri em texto disponibilizado na internet: “O amor e a loucura de Calvino e Fellini”.  Há um texto admirável de Calvino sobre Fellini, num livro que tenho aqui em casa mas não estou achando no momento. É a apresentação de um livro escrito por Fellini (qual, meu zeus?) onde Calvino escreve sobre o fascínio do menino Federico pelo circo, pela magia do circo que ficaria para sempre incorporada aos filmes do Maestro.

Fico por aqui, que a noite já vem. E quando a noite vem, você bem sabe (eu sou um rapaz de bem), vem a saudade (de quê mesmo, meu zeus?).  

Abraço grande e bom fim de semana, Ronaldo

30.05.23

Paulo Augusto,

    Esqueci de anexar os dois haicais mencionados no email anterior.

Vão agora R.

                  BYE-BYE

BAHIA

(Dois haicais)


1.

                     no porto da barra

mar da bahia me enlaça

bahia meu porto


2.

no rio vermelho

meu espelho é o sol

tarde que se esvai

RW/Salvador, 06 maio 2023

30.05.23

Paulo Augusto, meu querido

Escrevo com o indevido atraso. Várias aporrinhações desde que Patrícia e eu “aportamos da Bahia”. Comigo, não com ela: dor, dor nos costados, no encostado braço direito: formigamento, câimbra e etc. Ainda bem que sou canhoto. Mas que me levou a consultar um médico em Muriaé, já que o daqui não conseguiu resolver a parada. Problemas na cervical foi o vero veredito. Medicado por ele, fazendo fisioterapia e pilates, estou bem melhor: só o braço que ainda me amola. Mas nada de grave.

Você fala da morte da Rita Lee, que chocou todos nós. E falando em morte, acabo de saber da morte do Carlos Alberto Prates Correia. Pena. Gosto muito de seus filmes, autorais, doutorais. Apresentados pelo saudoso Zé Haroldo Pereira, Carlos Alberto e eu encetamos (encetamos?) vários papos no Rio (sempre regados a uísque vagabundo), na época em que ele estava começando a articular as filmagens de Perdida, com meu grande amigo Hélber Rangel no elenco. Depois disso, nunca mais nos encontramos. A morte anda por perto. Isso parece título de um filme. Tem algum filme com título parecido, meu caro? Passo novamente o link para o texto que escrevi sobre Fellini (estou lendo o livro que você enviou. Lendo e gostando muito) para a revista portuguesa A Viagem dos Argonautas, link que você não conseguiu abrir. Pra mim, está abrindo normal. Veja aí se você consegue. Abraço grande Ronaldo

FELLINI EM TRÊS TEMPOS

https://aviagemdosargonautas.net/2020/02/15/ronaldo-werneck-ha-controversias-fellini-8-1-2-no-mam-imperdivel/

30.05.2023 

Ronaldo, querido amigo,

Começo a acreditar que nossa comunicação tem algo de cósmico. Pensei em lhe telefonar ontem, devido ao seu sumiço após voltar da Bahia. Só não o fiz porque não consegui encontrar o número do seu celular, no meio da minha confusão. Era para saber se algo estava acontecendo com você ou Patrícia, que dificultasse a comunicação. Foi quando seu e-mail chegou, falando dos problemas que você enfrentava. Incrível: também eu enfrento dissabores semelhantes. Minha escoliose vem me provocando dificuldades no meu lado esquerdo (felizmente, sou destro!), às vezes com formigamento em alguns dedos do braço esquerdo.

Muito surpreso fiquei com a morte de Carlos Alberto Prates Correia. Liguei para Ronaldo de Noronha, velho amigo dele, que ficou arrasado, também não sabia. Já Mário tinha recebido a notícia dois dias atrás, quando se deu a morte. Enfim, todos reagiram mais ou menos da mesma forma: a fila está andando. Mais hora, menos hora, chega a nossa vez...

Seu texto sobre Fellini é ótimo. Também eu acabei de ler um livro com uma longa entrevista dele feita pelo crítico Giovanni Grazziani da revista "Bianco e Nero" e lançada em livro no Brasil sob o título "Entrevista Sobre Cinema" pela Civilização Brasileira nos anos 80. A edição que tenho é a francesa, que achei num sebo daqui, livro que pertenceu a uma velha amiga, Mara Molinari, que o comprou em Paris, quando estava casada com Ronaldo de Noronha, com quem tem uma filha. Há muito que não a vejo, desde que se separaram e ela se casou com um médico, abandonando a atividade cinematográfica. O livro é em momentos surpreendente, como quando Fellini afirma estranhar as novas gerações e suas tendências, por ser também ele um contestador.

Terminei de ler o livro póstumo de Rita Lee, "Outra Autobiografia" (grande título!), não tão bom quanto o primeiro, por se fixar num único tema, a descoberta e luta contra o câncer que, todo mundo já sabia, ela acabaria perdendo. Os detalhes, e principalmente algumas fotos, são terríveis. Saúde, meu amigo, também para Patrícia e, a vocês dois, meu abraço. Paulo

 

31.05.2023

Querido Paulo Augusto,

 Bom saber de sua preocupação com “nosotros”. Estamos bem. Quer dizer, a Patrícia. Eu continuo com dores lombares (é essa a palavra?), ou nos costados. Fui a um médico em Muriaé, bamba nas curas segundo informou a Rosa, minha irmã. Realmente o gajo me receitou uns medicamentos que amenizaram um pouco a dor. Mas, como você, eu ainda sinto um formigamento não nos dedos, mas em todo o braço direito, que às vezes incomoda muito. Mas sou canhoto, entonces a gente vai levando. Sim, a morte do Carlos Prates nos pegou a todos de surpresa. Uma pena. Sabe que ainda não li o livro do Fellini? Ele está aqui ao meu lado, me espreitando e solicitando leitura. Mas estou tentando escrever uma resenha do livro de uma amiga, a Denise Emmer (filha da Janete Clair e do Dias Gomes), e não está saindo nada. Já li o romance, mas não consegui anotar, o que sempre faço com todas as leituras.  E a Denise volta e meia pergunta se já li, se vou escrever sobre o livro. Um dia sai a resenha, espero. Desconheço a “Entrevista sobre Cinema”, do Giovanni Grazziani, como sequer jamais ouvi falar no próprio. Mas gostaria de ler. Li e gostei da primeira Autobiografia da Rita Lee, que ganhei de presente de aniversário de uma amiga no ano passado. Estou curioso para ler essa “Outra Autobiografia”. Fico por aqui, ansioso por ler sua outra mensagem falando do “mar de outrora”. Abracísssimos, Ronaldo

 

31.05.23

Ronaldo, amigo querido,

Venho de reler "o mar de outrora & poemas de agora".

Não tenho dúvidas: é seu momento maior, palavras e imagens.

Ronaldo que admiro, admito: poesia chama poesia, é fogo.

Seu livro é um primor, ouso dizer.

 O forte abraço do velho Paulo

 

31.05.23

Nossa, meu amigo, que baita elogio!

Fiquei ruborizado como tanta honra, principalmente vindo de quem vem. E em ritmo de poema, ora pois. O amigo é danado, sô! Agradeço muitíssimo suas palavras-poema, que vou guardar de imediato junto às resenhas que já foram feitas sobre esse meu livro.

Cada qual com seu cada qual: meu livro de que mais gosto ainda é o primeiro, Selva Selvaggia, que me custou 12 anos de feitura, i.e., de poemas escritos durante esse tempo, até que o livro fosse lançado em 1976 (a maioria dos poemas dele é dos anos 1960).

Mas tenho também um “carinho especial” sobre esse longo poema em torno do mar, poema que já havia publicado em 1999, junto com meu livro “minas em mim e o mar esse trem azul” (não sei se você tem esse livro), mas que ficara “meio perdido” dentro dele. Assim, resolvi republicar o longo poema com as fotos que Patrícia e eu fizemos ao longo dos anos e dar a ele o devido destaque, junto com novos poemas à época.

Elogio de cineasta sobre poesia é sempre uma honra. Agora gostaria de ver o que o nobre cineasta acha do vídeo-poema que realizei há alguns anos em torno do poema “o mar em mim”.

Veja no link a seguir. Grande abraço e gratíssimo por suas palavras, Ronaldo

O Mar - em - Mim - YouTube

 

03.06.2023

Querido amigo Ronaldo,

Mais uma vez em atraso quanto à sua resposta, vinha enfrentando há dias dor na coluna e dormência em parte do braço esquerdo. A coisa chegou num grau tal que o jeito foi comprar Dorflex na farmácia. Pelo menos o problema voltou a um nível tolerável. Recebi caixas com filmes de cineastas que admiro (Renoir, Bogdanovich, Preston Sturges), mas com a chegada da noite a temperatura cai bastante. Aí, prefiro ler debaixo das cobertas. Curioso você se consultar com um médico de Muriaé; lembro-me de Chico Peixoto elogiando aquele hospital daí e a competência dos profissionais que nele trabalham. Aconteceu uma piora no nível deles? O romance de Denise Emmer é bom? Dá para dar uma força a uma amiga? Por aqui, revi, após longo sumiço, Carlinhos Ávila, de cuja poesia gosto, mas obviamente não dá para chegar ao nível do pai. Quanto à mãe Laís, não sei dizer nada, não me lembro de ter lido ao menos um livro dela. Em outro e-mail que lhe envio em paralelo, comento sobre sua reação ao que eu disse sobre "O Mar de Outrora"  E Maiakovski. é dos meus poetas preferidos e a antologia organizada pelos irmãos Campos tem alto nível de tradução. Digo o mesmo do poema que você lhe dedicou. Abraço imenso, também para Patrícia! Paulo

04.06.23

Que dizer, meu caro Paulo Augusto,

senão me dobrar numa mesura de agradecimento. Seu comentário me “enche de glórias e me faz magnífico”, como dizia Rubem Braga naquela também magnífica crônica O Pavão (que comentei no meu primeiro Há Controvérsias). Sim, foram precisos cortes precisos, se é que me explico bem. Enxugar, extirpar tudo de excessivo para criar aquele “mar contido” do meu poema. Depuração que eu já vinha trabalhando nos poemas criados um pouco antes e logo depois, os que vieram, os que espero que venham. Merci, merci, merci bien.

Abração, Ronaldo  

 

04.06.23

Ronaldo caríssimo,

Os trinta e poucos minutos do seu vídeo-poema "O Mar em Mim" passaram num átimo (gostou?); ótimo! Não esperava algo diferente das imagens formadas à sombra de Mauro. E também, por que não dizer?, das raparigas em flor, vistas nas praias, nada desertas. Não sei se elogio de cineasta vale alguma coisa, mas este é sincero. O que gosto n"O Mar de Outrora" é exatamente sua plena capacidade de dizer tudo usando poucas palavras. Tenho certeza de que essa depuração foi sendo cada vez mais trabalhada,  mais estudada à medida que o tempo avançava. Sim, tenho "minas em mim e o mar esse trem azul", no qual você me fez uma linda dedicatória. De sua obra, só não possuo o "Pomba Poema", que Joaquim me deu quando fui a Catag para filmar meu "Verdes Anos" e que, ao que parece, se perdeu em uma das minhas mudanças. Já de início achava que a base de sustentação do documentário deveria ser a poesia e já na escritura primeira do roteiro incluí poemas de Chico, Guilhermino e Fusco. Quanto a seu livro, insisto: é um primor ouso dizer. Quero reler mais obras suas; assim, terminando minha atual leitura, voltarei ao "Minerar o Branco". Beijos e abraços para o querido casal, que lhes manda o velho Paulo

 

06.06.23

Ronaldo caríssimo,

Seu belo texto me trouxe à cabeça vários pensamentos e memórias. Tudo começou quando li que Gonçalves Dias e Fusco moraram nas "suas" ruas. Conheci em BH um advogado (chegou a trabalhar para mim) que teve uma filha que, jovem, tinha como passatempo pular de paraquedas. No seu último salto, o paraquedas não abriu - e ela se esborrachou para nunca mais. Lembrei-me daquela musiquinha da minha infância: "A Julieta tá/ Tá me chamando./ Eu pulei de paraquedas/ E o paraquedas não abriu./ Eu mandei o fabricante.../ Tomar refrigerante". O pai dela, íntimo de vereadores daqui, conseguiu que dessem o nome dela a uma praça numa região nobre de BH. Claro, motivado pela enorme saudade da filha. Houve inauguração festiva da placa. Hoje em dia, ninguém se lembra desse episódio, nem é capaz de saber quem foi a moça. Que, na verdade, nunca foi ninguém. Não se trata de caso único, conheço outros semelhantes. Por isso, não dou importância a esta "vaidade das vaidades". No meu "Verdes Anos", filmei aquelas placas de rua de Cataguases que homenageiam os verdes. Me pergunto quantos moradores sabem quem foram Chico e Guilhermino, ou mesmo Fusco. Há muito tempo, pensei em fazer campanha para dar o nome de uma tia minha, Suzy de Mello, a uma via da cidade. Ela foi diretora da Escola de Arquitetura da UFMG, autora de obras importantes (livros e projetos de construções), entre muitos outros feitos. Acabei desistindo; ela continua viva é dentro de mim. Enfim, seu texto me provocou várias reflexões sobre a condição humana. Pelo que lhe fico muito grato. Abraço grande para Patrícia e você, Paulo 

 

06.06.23

Atrasado, mas em tempo, meu caro amigo.

A moça do paraquedas que virou nome de rua e foi esquecida pela população: “exemplo exemplar” (evoé, Millôr!). Tem razão: nove entre dez cataguasenses não sabem quem foi Guilhermino ou Chico Peixoto. Fusco, nem tanto. Vamos dizer oito entre dez cataguasenses. Agrada-me saber que meu texto “provocou várias reflexões sobre a condição humana”. Aliás, nome de livro da Hanna Arendt, que conheço “de orelhada”. Sua tia Suzy de Mello viva dentro de você é o que basta para continuar viva. Abraço grande, Ronaldo


12.06.23

Paulo,

A minha dormência (que voltou ainda hoje), meu caro, é no braço direito. Dormência, fisgadas, choques: um horror. Também fui diagnosticado pelo médico de Muriáe com “problemas na cervical”. Estou fazendo fisioterapia, mas volta e meia volta o incômodo, que senti ainda há pouco. Vou voltar no médico de Muriaé: estive hoje à tarde no meu cardiologista: o coração está OK, tudo OK na parte dele. Finalmente, comecei a escrever sobre o romance da Denise Emmer, acho que agora meu texto sai. Na verdade, o livro da Denise atraiu minha atenção (tanto que li duas vezes!). Vamos dizer, é instigante. Sim, meu caro, o Maikóvski traduzido pelos Campos, com a ajuda inestimável do Boris Schnaiderman, é simplesmente o que há de melhor. Tenho a primeira edição e as várias outras que se sucederam, com a inclusão de novos poemas.  Abraço & abraços, Ronaldo


13.06.2023

Ronaldo, caro amigo,

Respondo, de uma enfiada, as quatro mensagens suas que me chegaram. A dormência a que me referi, no braço esquerdo, é a minha, causada pela compressão da minha coluna sobre um nervo. Tem melhorado, mas há momentos em que ainda me causa alguma dor. Já esteve pior. De Maiakovski, um sujeito casado com uma prima de Mário Coutinho lançou há tempos um livro com poemas, mas infelizmente com tradução precária. A edição dos irmãos Campos é de longe a melhor, com a inclusão de novos poemas; é a que tenho. Não me recordo de ter lido nada de Denise Emmer, mas fiquei curioso. Ando lendo o livro de um crítico francês, Michel Ciment (não, não é assim um cara muito duro, hi, hi, hi...) sobre Kubrick, de quem tenho toda a obra. Mas confesso que meu interesse por ele vem decrescendo bastante, desde que vi "2001" no lançamento brasileiro. À época, achei uma maravilha; fui rever o filme após mais de 50 anos e custei a chegar ao fim. Me pareceu pretensioso até não mais poder, agora. Tenho já consulta marcada com meu dentista para esta quinta-feira, pois um dente postiço meu está quase solto na boca e me cria dificuldades para mastigar. Ah, sim: também revi o primeiro longa de Fellini, co-dirigido por Alberto Lattuada. É "Mulheres e Luzes" (Luci del Varietà), no qual a brasileira Vanja Orico canta "Meu Limão, Meu Limoeiro", na sua doce juventude. Abracíssimo para você e Patrícia, que lhes manda o velho Paulo 

 

14.06.23

Caro Paulo Augusto

Ao contrário da sua, minha dormência & choques & pequenas dores no braço esquerdo parecem resultado de “ingresia na vertical”, quer dizer, problemas na cervical, se é que me expresso bem, coisa que nunca faço de manhã.   Diz o pessoal daqui uma coisa que acho ótima: “o fulano tá dando defeito” (quando alguém fica doente). Pois é, a gente vive dando defeito. Sim, a tradução de Maiakóvski pelos Campos é imbatível. Tenho várias edições com tradução deles, desde a primeira, de 1966 (?) até a última, de 2017, da Perspectiva, dentro da Coleção Signos, dirigida pelo Augusto, com capa dura, novos poemas e tudo o mais. Estou acabando (finalmente!) o texto sobre Denise Emmer: publico semana que vem. O nome Michel Ciment não me é estranho. Gosto até hoje do 2001, que revi quando o filme fez 50 anos e acabou que fiz um vídeo “comemorativo”, tendo meu poema sobre o filme (escrito em 1968, quando do lançamento no Rio) como pano de fundo. Vou colocar o link para o vídeo no final deste arrazoado.

Dentista é o “ó” (conhece essa expressão, ou é mesmo coisa de Cataguases?). Só resolvi meus problemas dentários quando fiz alguns implantes, anos atrás. Desde menino tive péssimos dentes. Tenho o “Livro do Bebê”, ou coisa que o valha, onde mamãe relatou (com fotos e desenhos) os primeiros meses do jovem infante. “A primeira palavra que falou foi “cooperativa”(acho que mamãe pirou nessa: como fui falar palavra tão complicada?). Lá pelas tantas, elas escreve. “Ele tem a saúde perfeita, só não tem bons dentes” (ou coisa parecida: não estou com meu livro do bebê à mão).  Dentes e dentistas, à parte, já vi e revi várias vezes Luci del Varietà (gravei o filme em VHS ainda no Rio, direto de uma exibição em alguma canal de tevê, e passei pra DVD). Sim, a cena de Vanja Orico cantando “Meu Limão, Meu Limoeiro” é mencionada por nove entre dez fãs brasileiros de Fellini. Dessas coisas que só acontecem comigo (e com o resto dos cinemaníacos): estive ao lado de Vanja Orico anos e anos atrás, num evento cinematográfico na Cinemateca do Rio (?). Literalmente ao lado. Ela sentou-se do meu lado e, cego que sou, só percebi isso quando ela foi chamada ao palco, levantou-se e pediu licença para passar entre as minhas pernas. E saiu, baixinha e já meio redondinha rumo ao palco. Acontece.

Veja a seguir o link para meu vídeo sobre 2001(que está no meu Canal do Youtube) . Abração do velho (80 anos em outubro: nossa!) Ronaldo

Link para o vídeo-poema: 2001- 50 anos - YouTube

 

21.06.2023

Ronaldo caríssimo,

Ótimo que você tenha terminado seu texto. Como nunca li nada de Denise Emmer, fica difícil dizer alguma coisa sobre o trabalho dela. Você pretende publicar sua avaliação em algum lugar ou apenas mandar para ela, como material de divulgação? Fiquei com a sensação de que é mais esta última hipótese. Estou a ler um velho poeta simbolista brasileiro, Cruz e Souza, cuja obra em versos completa veio parar na minha mão. Elogiado até por Cecília Meireles, esse negro catarinense, filho de escravos, que veio a falecer numa cidade do interior mineiro em fins dos 1900 devido à tuberculose que o matou aos 38 anos, pertence a outra época, na qual o uso de muitas palavras arcaicas era a tônica. Pode ser que ainda saia entusiasmado desta leitura, mas ainda não é o caso. Abraços e beijos para você e Patrícia, do seu amigo Paulo


21.06.23

Paulo, meu “cauro” (também sei rimar, como se vê).

Acabo de reenviar pra você o texto que escrevi sobre o livro da Denise. Parece que você não tinha recebido. Cruz e Souza é também uma de minhas “falhas do rol das confessáveis’ (apud Rosário Fusco). Lancei livro em Florianópolis em 2009 e ganhei do pessoal de lá uma belíssima edição completa das obras de Cruz e Souza, em dois tomos, luxuosamente encadernada & etc & tal. Lá se vão não sei quantos anos e ainda não me detive com vagar na obra do poeta simbolista. Sei dele o que todo mundo sabe, aquelas belas aliterações do “vozes veladas veludosas vozes” e mais um ou outro verso. Nada mais. Tanta coisa pra ler/reler, tanta coisa e a vida se esvaindo. Patrícia manda um beijo. Abração, Ronaldo

 

25.06.2023

Ronaldo, meu caro,

Não há vantagem nenhuma do Chico; eu também sou leitor de RW, ora! (Paulo se refere aqui a uma postagem onde eu soube que o Chico Buarque teria dito que “era meu leitor”). Só nunca joguei no gol; fui um lateral-esquerdo dos mais medíocres, hi, hi, hi... E nunca fui aluno do colégio dirigido pelo Chico Peixoto – e aí lamento muito. Não se pode ter tudo na vida, não é mesmo? Não conheci Napoleão, mas sei que foi um grande artilheiro. Deixou marca definitiva na França, hélas! Abraço grande, também um beijo para Patrícia, que lhes manda o velho Paulo


26.06.2023

Paulo, caríssimo:

Deixemos o futebol pra lá: também eu não fui lá “esse goleiro todo” (mas há controvérsias!). É de se lamentar, sim, você não ter sido aluno do Chico Peixoto, meu diretor e professor de espanhol. Napoleão, esse de que o Chico tanto gostava, realmente jogava muito. Chegou a jogar no juvenil do Fluminense com o nome de “Fred”. Não o Fred de agora, mas sim o “AlFREDo Napoleão” dos anos 60, meu saudoso amigo e também do Chico. Em campo, era mesmo “um Napoleão”. Abraço grande, Ronaldo

 

05.07.2023

Caro Ronaldo,

Parabéns pela entrevista. Devido a um acidente doméstico comigo, serei breve desta vez.

 (...) Estou melhor, Ronaldo, obrigado, mas ainda carecendo de cuidados, após o tombo que levei.


08.07.2023

Paulo Augusto, meu querido,

Só agora vejo esse seu email. Espero que esteja melhor. Também eu levei um tombo há coisa de uma semana. Caí da cama dormindo, vê se pode! Quando vi, estava estatelado no chão em plena madrugada. A cabeça doendo, algumas escoriações sem importância, Patrícia me levantando, Clara latindo sem entender, minha neta Julinha e a Ulla também me acudindo, um troço, sô! A casa toda em polvorosa (sempre quis usar essa palavra, mas nunca tive oportunidade; então, lá vai). Estive sexta-feira num médico que me pediu uma tomografia do crânio (às vezes ainda há dores “de cabeça”, mas não “dores na cabeça”, o que seria resultado da queda). Vou fazer a tomografia amanhã. Idade é foda. Acontece. Abração, Ronaldo

 

ÚLTIMOS EMAIS

23.07.2023

Paulo Augusto,

Preocupado com você, meu caríssimo. Tudo bem? Há tempos que você não “aparece” aqui nos e-mails, nossa forma de comunicação, já que você não tem Whatsapp nem Facebook. Liguei ainda pouco pra você, mas ninguém respondeu. Dá notícia, meu amigo. Grande abraço, Ronaldo

24.07.2023 /Email para Mário Alves Coutinho

Mário, meu caro

Estou, preocupado com nosso amigo Paulo Augusto. Você tem notícias dele? A gente costuma se “falar” aqui por email quase toda a semana, mas faz quase um mês que ele não se comunica comigo. Você sabe como ele está? Ainda ontem liguei para a casa dele, mas ninguém atendeu. Abraço, Ronaldo

 

25.07.2023

Paulo Augusto, meu caro,

O título aí de cima diz tudo: estou preocupado com você, com sua saúde, seu silêncio. Está tudo bem? Dá notícia, meu amigo. Abração, Ronaldo

 

25.07.2023 /Email de Mário Alves Coutinho

Caro amigo:

Tudo bem com Você? Vou resumir: primeiro, o Paulo caiu no banheiro, e quebrou o braço. Alguns dias depois, ao ir ao banheiro, de noite, caiu e quebrou a perna. Ficou vários dias sem ir ao hospital. Quando foi, constataram que ele havia quebrado a perna, e precisava ser operado. Como constataram que ele estava com uma pneumonia, e além disso estava com o açúcar alto, da diabete, esperaram que ele tivesse regularizado a situação, para operarem. Ele foi operado ontem, e segundo a cuidadora dele, Claudia, está bem, melhor do que estava. Ainda está na UTI. Deve sair de lá hoje ou amanhã. E vai para um quarto. Vai ter que fazer fisioterapia. Está no Hospital Semper. Ufa!!!!!!! Um abraço para você sua esposa.  

 

25.07.2023 /Email para Mário Alves Coutinho

Nossa, meu caro,

Quanto imbróglio com nosso amigo! Uma verdadeira sucessão de desencontros. Por isso então ele havia sumido daqui dos e-mails. Espero que ele saia logo dessa. Estamos torcendo. Peço que me dê notícias dele. E você, como está? Patrícia e eu mandamos um baita abraço, Ronaldo

 

28/7/23/Email para Mário Alves Coutinho

Mário, meu amigo

Acabo de falar por vídeo (graças à cuidadora Cláudia) com o Paulo Augusto. Ele me pareceu bem, chegamos mesmo a brincar na conversa. Espero que ele saia logo do hospital. Agradeço a você o contato dele. Grande abraço, Ronaldo.