15 de out. de 2022

TRICÔ MINEIRO

     


     Com licença que continuamos aqui nesta infindável tricotagem com o imponderável auxílio destas teclinhas acionadas num ritmo que a agulha centenária da Vovó Cota jamais conseguiria acompanhar. Tão rápido que nem dá tempo pra perder o próprio com vírgulas né mesmo? Pois bem: adentramos impávidos o restaurante Canto Mineiro na última sexta & by night como sempre. Eis que, cheia a casa, nos vimos subitamente membros do TSM: leia-se Tô Sem Mesa.

     Chove lá fora. Cá dentro, a simpatia das meninas Ednéa Peixoto e Licínia Cardoso nos convida a sentar. Meninas sim, meninas as duas sempre serão. Não mais TSM. Agora sim, TCM: Tamos Com Mesa. E nem vocês precisam pedir licença – também estão convidados para esta noite de tricô mineiro. Para esta mesa de (l)argamassa (Penne! Penne com molho branco & milho, para horror de todos os italianos, inclusive meu amigo Afonsim) & drinques finos. Beba-se, i.e., leia-se súbito e num só oxítono: tonicacumguaraná. Então, vamos lá. Ou venham cá, como preferirem.

    Ednéa-Licínia: como me lembro eu-meninim da beleza dessas menininhas!  Ednéa, a mais bela Rainha do Tiro de Guerra, logo depois da própria: ali, meio que na virada dos anos 40.  Ednéa & seus blue-eyes-oh-yes: azuis-mais-que-azuis. Que nem a Maysa Matarazzo da década seguinte: os olhos de Ednéa são dois não sei quê dois não sei como diga dois Oceanos Não-Pacíficos (gracias, seu grandessíssimo zé-mané Bandeira!).

     E a Licínia, então, aquela Licínia que inundou de irrecuperável amor o não menos Antônio-Clark-Gable-Cardoso e sua bigodal figura. A mais bela Licínia como a vi numa foto de mocinha na Fazenda Sinimbu, a Licínia que está aqui à nossa frente e que lá está na parede, flagrada para sempre, muito da smart, com seu it, seu requinte, sua placidez pós-guerra, Rita Hayworth refulgindo-re-full-Gilda com seu charm evolando fumaça Cataguases afora.

     E Cataguases afora, noite adentro, falamos. E como falamos! E quanto tricô, sô! Os de antanho, aqueles tricôs de nossas velhas comadres, são meras costurinhas perto de nossa sofisticada tricotagem sobre as gentes, os dementes, os indigentes, os frementes & seus repentes, os amantes ardentes (nem tanto, nem tanto!). Aquele fulano da rua tal, você se lembra? E aquela que foi casada com aquele que descasou daqueloutra? Pois é, quem diria!

     E tome de tricô catuauá, de tricô cotidiano. Perdão, “catadiano”. E “tricodiamos”, bocas geladas por providenciais sorvetes. De que falávamos mesmo? De tudo e de nada, que é uma forma de empurrar a madrugada da província rumo à manhã de domingo. Falávamos de quem mesmo? Da gente catuauá. No fundo, do nosso amor por todos, por essa coisa toda que nos esquenta como o cafezinho de agora. Epa! Vamos embora que já são duas da matina, meninas!



Cataguases, 20.07.2003

in Há Controvérsias 2

São Paulo, 2011

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