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No início, poemas e paz
Em
Santiago do Chile, no dia 15 de outubro último, nós (minha mulher Patrícia
Barbosa e eu) almoçamos no “Espacio Cultural Taller Siglo XX Yolanda Hurtado”,
no Barrio Bellavista, com seu coordenador, o poeta e artista visual Leo Lobos:
“Saímos daí disparados a seguir rodando/pelo lado escuro da cidade/um grupo de rastas fumam pelas beiras/ de um lugar noturno onde esta noite toca um demônio.//
Queimamos as antigas imagens que tínhamos deles e em pouco/as nossas se fazem
cinzas/
que o vento/leva”. Leo Lobos já morou no Brasil e é um expert em
Hilda Hilst, tendo vertido para o espanhol várias de suas obras: “As barcas
afundadas. Cintilantes./ Sob o rio. E é assim o poema. Cintilante/ E obscura
barca ardendo sob as águas”.
No almoço, estava também o poeta e crítico literário de “El Mercurio” de
Valparaiso, Francisco Véjar. No cardápio, política e poesia: os dois chilenos absolutamente
atônitos com o que está acontecendo no Brasil. As bolsonárias bravatas e
barbaridades são agora nosso principal produto de exportação. No Chile, como
logo depois em Lisboa e em Paris, era o que ouvíamos quando se falava em
Brasil.
Nos dias seguintes, poemas-entrevista no Programa “Creadores”, comandado pelo poeta PaViTo na TV de Rancagua; poemas-palestra na Casa de la Cultura de Santo Domingo; leitura de um dos poemas de Neruda para sua amada Matilde, La Chascona, à beira da sepultura dos dois, na Isla Negra; “Encuentro Poético con la Comunidad Escolar de La Escuela Las Canteras de Huechuraba”.
O Chile parecia aparentemente calmo durante o “5to. Encuentro Internacional de Arte y Poesia Navegando Cielos del Mundo”, organizado pela poeta Irem Toal. O encerramento seria na noite de 18 de outubro, no Museo Histórico Nacional, na Plaza de Armas. É ali que se localiza também o Palácio de la Moneda, sede do governo chileno.
Entrevista na TV de Rancagua |
Nos dias seguintes, poemas-entrevista no Programa “Creadores”, comandado pelo poeta PaViTo na TV de Rancagua; poemas-palestra na Casa de la Cultura de Santo Domingo; leitura de um dos poemas de Neruda para sua amada Matilde, La Chascona, à beira da sepultura dos dois, na Isla Negra; “Encuentro Poético con la Comunidad Escolar de La Escuela Las Canteras de Huechuraba”.
O Chile parecia aparentemente calmo durante o “5to. Encuentro Internacional de Arte y Poesia Navegando Cielos del Mundo”, organizado pela poeta Irem Toal. O encerramento seria na noite de 18 de outubro, no Museo Histórico Nacional, na Plaza de Armas. É ali que se localiza também o Palácio de la Moneda, sede do governo chileno.
Mas naquela noite a
Plaza de Armas já estava cercada devido aos protestos. De início, coordenados
por estudantes para evitar pagar o metrô, em resposta aos recentes aumentos de
preços. Logo depois os protestos, agora multidão (mais de um milhão de pessoas,
numa cidade cuja população não chega a cinco milhões), se estenderam pelas ruas
de Santiago contra o governo de Sebastián Piñera. O encerramento do nosso “Encuentro” foi então
transferido para o segundo andar de um restaurante japonês no Barrio Lastarria.
Foi dali, da sacada, que pudemos registrar o início das “manifestaciones” que
tomariam todo o Chile até hoje, apesar da truculência dos “carabineros” (resquícios
dos tempos da ditadura de Pinochet) despejados pelo presidente Piñera ruas adentro
e afora.
No dia seguinte, almoçamos nas proximidades de nosso hotel, no Centro de Santiago, e vimos a continuidade das “manifestaciones”, que recrudesciam. Nossa volta foi uma correria só em busca do hotel, enquanto os “carabineros” lançavam gás lacrimogêneo e tiros de borracha, às tontas e indiscriminadamente. Não mais saímos: Piñera havia decretado um toque de recolher, pela primeira vez desde 1987, no final da ditadura Pinochet.
No dia seguinte, almoçamos nas proximidades de nosso hotel, no Centro de Santiago, e vimos a continuidade das “manifestaciones”, que recrudesciam. Nossa volta foi uma correria só em busca do hotel, enquanto os “carabineros” lançavam gás lacrimogêneo e tiros de borracha, às tontas e indiscriminadamente. Não mais saímos: Piñera havia decretado um toque de recolher, pela primeira vez desde 1987, no final da ditadura Pinochet.
O que nos impediu de
assistir a uma peça de García Lorca, que seria encenada no “Espacio” coordenado
por meu amigo Leo Lobos, cancelada por razões óbvias: “Teatro La Memoria suspende
su función hoy em apoyo a las justas demandas sociales y el rechazo a la
declaración de Estado de Emergencia y la presencia de militares em las calles. TAMBIÉN
LA CULTURA ESTÁ EM PELIGRO!”.
No domingo, 20 de
outubro, voamos para Lisboa, onde lancei meu novo livro. Enquanto nosso transfer
rodava pelas ruas de Santiago rumo ao aeroporto, vimos num lento e longo
travelling as ruas castigadas da capital e a população fazendo uma limpeza na
medida do possível. Já em Lisboa, recebo mensagem de Leo Lobos sobre os
protestos: “Muy válidos, amigo. Absolutamente justificados”. Foi só pela TV
portuguesa que tivemos maiores informações sobre as brutalidades cometidas pelo
exército chileno. Parecia que Pinochet estava de volta.
Jânio & Conti
No domingo, 17 de
novembro, Jânio de Freitas – com argutas palavras, como sempre – registrava os
acontecimentos no Chile em sua coluna da Folha de S.Paulo: “Fora as classes altas, os chilenos estão nas ruas,
manifestando-se ou combatendo, por redução das usurpações e das opressões
econômicas a que são submetidos. Já são mais de 25 mortos e mais de 200 com
lesões nos olhos, e mesmo cegueira. Inerte, o que o governo Sebastián Piñera –
um dos mais opulentos empresários do país – tem a propor para a pacificação é
um plebiscito em abril, daqui a cinco meses, sobre uma nova Constituinte. É
claro que pensa no esmorecimento da rebelião, para voltar ao que Paulo Guedes
definiu como “paraíso chileno”. Explosivo, porém”.
No último sábado, 23 de novembro, em sua coluna da mesma Folha de S.Paulo, Mario Sergio Conti, de uma só vez, remete às fanfarronices do inacreditável governador Witzel e de cambulhada ao não menos Bolçonário, aquele cara fora de qualquer dicionário: “A polícia chilena atirou na cabecinha e cegou dezenas de insatisfeitos, As multidões cantam seus mutilados e mártires. E os bens de vida zelam para que os pés rapados não se aposentem nunca, os desempregados sejam taxados e o agronegócio queime a Amazônia: é cultural, tá oquei?”.
No último sábado, 23 de novembro, em sua coluna da mesma Folha de S.Paulo, Mario Sergio Conti, de uma só vez, remete às fanfarronices do inacreditável governador Witzel e de cambulhada ao não menos Bolçonário, aquele cara fora de qualquer dicionário: “A polícia chilena atirou na cabecinha e cegou dezenas de insatisfeitos, As multidões cantam seus mutilados e mártires. E os bens de vida zelam para que os pés rapados não se aposentem nunca, os desempregados sejam taxados e o agronegócio queime a Amazônia: é cultural, tá oquei?”.
No
dia seguinte Jânio de Freitas (sempre ele) acrescentava em sua coluna: “Uma das
características mais persistentes em Jair Bolsonaro, que nem as tem muitas, é a
de servir sempre e só a segmentos do seu pequeno mundo mental. A população, o
país como riqueza e futuro, os princípios gerais e seu sentido na nacionalidade
têm, um a um, dimensão excessiva para a compreensão, e mesmo para a simples
percepção de Bolsonaro”. ]
Então,
fica assim, tá oquei? Enquanto isso, convido vocês a verem no vídeo acima alguns registros do “Encuentro de Poesía Y Arte” e do início das “manifestaciones”
em Santiago do Chile.
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