2 de jan. de 2020

Wanda Pimentel: Geometria do olhar



Republico a seguir o texto que escrevi para o catálogo da exposição
da artista plástica carioca Wanda Pimentel, realizada no CCBB/Rio em 1993.
Wanda faleceu no Rio de Janeiro aos 76 anos, em 23 de dezembro de 2019.

Composta em sua totalidade por trabalhos inéditos, elaborados neste 1993, essa mostra da artista plástica Wanda Pimentel foi preparada especialmente para exposição no Centro Cultural Banco do Brasil. Aqui, ela busca a comunicação imediata com o espectador através da sobriedade das linhas, das cores lisas e chapadas. Preocupação antiga, permanece a solidão de estar-no-mundo, representada pelos bronzes metafóricos da presente “Série Monumentos”.
  Fotografadas previamente por Wanda em incursões de fins-de-semana, a cidade vazia, essas estátuas entram nos quadros como se não entrassem, quase como esculturas à parte, tridimensionais, quase como se, à nossa semelhança, também observassem detalhes de uma cidade desconhecida. Não existem indicações nos pedestais desses monumentos que, antônimos, enquadrados pelas costas, colocam-se do ponto de vista do espectador, olhando em perspectiva.
            Wanda Pimentel percorreu longa estrada em quase seus trinta anos de ofício nas artes plásticas. Caminho entremeado por muitas coletivas e individuais, marcantes participações na Bienal de São Paulo, um Prêmio Salão Verão que lhe deu uma viagem à França nos anos 70, onde participa da Bienal de Paris com suas instalações registrando bueiros, tapumes, ralos de captadores de águas fluviais. Tempo de Pop Art, simplificação de formas, cores mais chapadas.


Na década de 80, surgem as mortalhas, as “Paisagens do Rio”. Wanda passa a ver a cidade como se nos dissesse “olhem o que estou olhando, vejam comigo como  eu vejo o mundo que nos cerca”. Ao entrar nos anos 90, a artista imprime maior rigor formal aos seus trabalhos. Wanda Pimentel é agora mescla de tensão e contenção, de despojamento. Os enquadramentos são demarcados por traços precisos, realçando os detalhes, como se ela direcionasse o espectador.  Seus quadros hoje refletem um denso, contido cromatismo, apenas com alguns vazamentos luminosos em cinza sobre a dramaticidade de cores por ela mesmo preparadas, tons em preto, raros verdes e magentas, alguns ocres e azuis intensos. É exatamente assim, com essas cores escuras, que a artista consegue maior tensão e expressividade.
            Aos 50 anos, Wanda Pimentel afirma estar em pleno amadurecimento de suas ideias, com o mesmo pique que possuía na década de 60: “Sinto um domínio do instrumental, um conhecimento maior”. Ativa participante da ebulição dos anos 60, um dos destaques da geração que revitalizou e deu rumo às artes plásticas no Brasil, Wanda Pimentel trilhou uma trajetória de experimentos que lhe deixou lastros de sólida experiência, direcionando a artista para a conquista de uma linguagem pura, despojada, sua marca de expressão por excelência. Esses trabalhos são plasmados num modo muito particular de enquadrar o mundo, de olhar com olhos de ver as coisas, as casas, os objetos configurados em precisa geometria, habitantes de uma paisagem que oprime.



Ronaldo Werneck/CCBB Rio, 1993

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