Aos 79 anos, meu amigo, o cineasta
Paulo Martins (Cataguases,
05.05.1945 – Campinas, 15.11.2024), morreu na sexta-feira
passada em Campinas, onde lecionou por muitos anos na Unicamp. Paulo foi professor do Instituto de Artes
da Universidade Estadual de Campinas, onde ingressou em dezembro de 1983 e se
aposentou em maio de 2015. Ali ele participou da criação do Departamento de
Multimeios, Mídia e Comunicação da Unicamp, e coordenou a realização de dezenas
de produções de alunos em vídeo, audiovisual e cinema.
A última vez que nos vimos foi há coisa de uns dez anos, se tanto, quando o advogado Rogério Torres criou aqui em Cataguases um Clube de Leitura intitulado “Nossas causas”, menção a uma dos muitos slogans do filme O Anunciador, o Homem das Tormentas, dirigido e filmado em Cataguases por Paulo Martins nos anos 1960, aos 22 anos. Paulo veio para a inauguração, quando foi homenageado na presença de dois outros atores do filme, o protagonista Carlos Moura e o hoje saudoso poeta Antônio Jaime Soares.
No
outro dia, eu o levei para almoçar em Piacatuba. Caía uma chuva fina e caminhamos
com dificuldade pela rua das Pedras. “Nossas causas”: ele em função da
paralisia infantil, que deixou sequelas pela vida inteira; eu, pelo barrigal peso
da idade, longe dos esquálidos tempos da mocidade. Tudo rimado, poeta compulsivo
que sou. Mas, como sempre, entre um escorregão e outro, Paulo falava e falava
sempre sobre cinema – ele que sempre gostou de falar andando, como a se mostrar
vencedor da paralisia sofrida na infância.
As voltas da mocidade
Alguns anos à frente – ou atrás, já que falo anos depois, e essa língua portuguesa ainda vai entortar minha cabeça – soube que ele tivera um AVC lá em Campinas e sofria com constantes internações, a vida entre o hospital e a sua casa, onde se “loucomovia” na cadeira de rodas. Na época, nós nos falamos algumas vezes por telefone, Paulo sempre bem-humorado. Engraçado que nossas conversas telefônicas raramente passavam pelo cinema, como antes, mas voltavam-se agora para “nossas causas” dos velhos tempos, aquelas besteiras da juventude. Lembro que cheguei a falar com ele sobre a máxima de Rosário Fusco: “A gente só se lembra das besteiras que fizemos. Um dia normal – café, trabalho, almoço, trabalho, jantar, cama – fica esquecido. Mas se houve alguma mancada, se tivermos feito alguma besteira, esse dia jamais será esquecido”. E nós – ele, eu, todos nós – demos várias e inesquecíveis mancadas vida afora.
Fomos amigos desde os tempos da mocidade, eu às voltas com a poesia e suplementos literários e Paulo com o teatro e principalmente com o cinema, sua obsessão. Com 22 anos, ele foi o primeiro cineasta a realizar um longa-metragem em Cataguases, 40 anos depois de Humberto Mauro: O Anunciador, o Homem das Tormentas. O que necessariamente não significava desinteresse de Paulo pela literatura, como se vê pela foto (década de 1960) em que ele visita o escritor Rosário Fusco em sua casa de Nova Friburgo. Naquela Cataguases da década de 60, e quatro décadas depois, nós nos semelhávamos, de certa forma, àquela Cataguases dos anos 1920, de Humberto Mauro e dos Verdes. Paulo Martins e sua turminha, como Mauro, já focados no cinema; Joaquim Branco, eu e os “bardos barbudos” do Totem, como os Verdes, às voltas com a literatura, o poema em processo.
Eisenstein & Agedor
Ele
me aplicou Eisenstein, Truffaut, Buñuel, fora todo o pessoal do Cinema Novo.
Também pudera: o cine-clube criado por Paulo Martins na Cataguases dos anos
1960 (do qual fui vice-presidente) chamava-se nada menos que Sergei Eisenstein,
em homenagem ao grande cineasta russo, e foi inaugurado com o filme “Os
Incompreendidos” (Les quatre cents coups),
de François Truffaut. Ah, sim: Buñuel. A produtora que ele fundou junto com o
poeta Francisco Marcelo Cabral (e que produziu O Anunciador, iniciado em 1967 e só lançado em 1970) chamava-se
“Agedor”, título naturalmente extraído do filme L´Age d´Or, de Luis Buñuel.
No
Rio, 1963 – quatro anos antes das filmagens de O Anunciador em Cataguases –, Paulo eu moramos numa pensão na Rua
Voluntários da Pátria, em Botafogo (onde hoje é a Livraria da Travessa, uma rua
agora “estrelada” por várias salas de cinema). Foi quando nos aproximamos mais,
longos papos noite adentro. Literatura e música, sim. Mas cinema sempre, sempremente
cinema.
Após o jantar, a gente ficava sentado na porta da pensão (está lá ainda hoje, aquela porta altíssima em frente às salas de cinema do Estação Botafogo), papeando à toa enquanto passavam por nós os últimos espectadores do antigo cinema que existia no início da Voluntários, pros lados da Praia de Botafogo.
Acho que aquele cinema se chamava Cooper, como acaba de me informar meu amigo Cavi Borges, hoje responsável pelo Espaço Itaú de Cinema, que lá existe onde foi o velho Cooper. É Cooper mesmo, Cavi? Um cinema ali do nosso lado, mas que não frequentávamos: afinal ali só passava porcaria, nada dos “filmes-cabeça” que povoavam nossos papos e cabeças em constante movimento, no passar dos fotogramas. Como no cinema, o “verdadeiro”.
O Desafio & Isabella
Foi então que Paulo Martins se
enturmou com o pessoal do Cinema Novo, principalmente com o cineasta David
Neves (que conheci por meio dele, e de quem me tornei amigo vida afora). Em
1965, Paulo foi assistente de direção do seminal “O Desafio”, o ousado filme de
Paulo Cezar Saraceni, realizado logo após o golpe militar de 1964, com Oduvaldo
Vianna Filho, meu grande amigo Luiz Linhares e Isabella, na época casada com
Saraceni. De quebra, havia Maria Bethânia em cenas do show Opinião, espetáculo que vi várias vezes, não só com Bethânia, como
antes com Nara Leão.
Tempos depois, Isabella morava num prédio nas proximidades do Jardim de Alah e eu ia lá com o Paulo, e acabamos amigos. A bela Isa tinha um Gordini que eu namorava. Não ela, mas ele. Acabou que logo à frente um Gordini, o “bólido” como eu o chamava, virou meu primeiro de muitos carros vida afora. Anos e anos e depois, Isabella me deu a honra de vir do Rio a Cataguases em 2005, junto com uma penca de poetas e artistas, para o lançamento de meu livro “Revisita Selvaggia”
Tudo
por obra do Paulo Martins, na época já morando em Campinas. Mas foi ele quem me
“introduziu” a ela e a eles se assim posso dizer, a vários dos luminares do
Cinema Novo. Já no início deste século, quando Mônica Botelho, Henrique Frade e
eu organizamos a Confraria do Cinema aqui em Cataguases – pontapé inicial para
o Cineport, o Festival de Cinema de Países de Língua Portuguesa, que
aconteceria logo depois –, Paulo Martins esteve conosco como um dos confrades.
E com ele cineastas como Walter Carvalho (meu amigo de longa data), Paulo
Augusto Gomes (amigo da vida inteira) Nelson Pereira dos Santos, Paulo Cezar
Saraceni (ficamos desde então muito próximos até sua morte, Saraceni sempre me
falando de seu amigo maior, Glauber Rocha) e do dramaturgo Alcione Araújo (viramos
“amigos de infância”, como Alcione me dizia). À exceção de Waltinho Carvalho todos
mortos – e agora percebo isso, em meio ao espanto que é a vida e o nada que é a
morte. Isso só pra me perder em filosofia barata, o que às vezes acontece.
Censurar quem há-de?
O anunciador fala &
anda
Rio, meados de 1968. Eu morava no Leme
e namorava uma cataguasense então desquitada. Às escondidas, claro, que àquela
época as famigeradas más-línguas de Cataguases não admitiam nem moças
desquitadas, muito menos moças desquitadas com namorados. Era aí pelo início da
noite quando tocou a campainha da porta. Tempos sem celular e sem ao menos telefone
no apartamento, as poucas visitas apareciam assim, de repente. Abro e dou de
cara com meu amigo Paulo Martins.
“Visita surpresa”, foi logo dizendo o jovem cineasta. Que levou um susto: surpreso ele, e totalmente, com minha nova namorada, que Paulo conhecia de Cataguases. Tanto que mal entrou começou a falar ininterruptamente, andando pela sala, melhor mancando pela sala (ele sofrera paralisia infantil e mancava de uma das pernas).
Andava pra lá e pra cá, e falava, falava, às vezes nos olhando, com o perdão da palavra, “de soslaio”, nós dois de mãos dadas, eu e minha namorada, ele sem entender direito. Falava de um projeto que queria que eu participasse, mas tão rápido e atabalhoadamente que não consegui entender quase nada.
Paulo sempre falou andando, como se a suprir o defeito em uma de suas pernas. Súbito, freou seu discurso e o próprio corpo. Stop. Vira-se pra mim: “Puxa, Ronaldo, tenho que ir, vou ver o filme do Godard no Paissandu”. Mal se despediu, ele sumiu. Melhor: mandou-se mancando porta afora. Bem Paulo Martins, o inesperado.
Glauber em transe:
Paulo “Jardel” Martins
Corria a boca não muito pequena que
Glauber Rocha teria escolhido o nome “Paulo Martins” para o poeta representado
por Jardel Filho em Terra em Transe
em homenagem ao Paulo. Recado do revisor Antônio Jaime Soares ao rever meu
livro sobre Humberto Mauro: “Checa isso com o Paulo Martins, pois Terra em Transe é de 1967 e O Anunciador só ficou pronto em 1970”.
Mando então email pro Paulo, pra destrinchar o busílis: Eis sua resposta:
“Ronaldo, o acontecido foi assim: houve
à noite um evento na Maison de France, não me lembro se de cinema ou de teatro,
e na entrada e/ou saída o Glauber falou que estava escrevendo um roteiro e nele
tinha um personagem com meu nome, em minha homenagem. No momento, não levei
muito a sério, desconfiado, como um bom mineiro, e vindo de uma cabeça
inquieta/inquietante como a do Glauber. Esqueci o acontecido e quando fui ver Terra em Transe lá estava o Jardel Filho
com o meu nome. Ainda como um bom mineiro, fui divulgando o corrido de forma
lenta e somente para os mais chegados. Este/esse é o resumo simples da
história/estória”.
Data do email do Paulo: 14 de março de
2009. Exatamente o dia em que Glauber faria 70 anos. Abro o Globo no mesmo dia
e leio na coluna de meu amigo Zuenir Ventura: “(...) cineasta genial (Glauber)
foi um personagem cuja ação transcendeu a área cultural. Inquieto, instigante,
instigador (...) o criador de Terra em
Transe tinha por hábito desnortear as expectativas. Em um tempo de
maniqueísmo ideológico, ou se era uma coisa ou o contrário, ele se divertia em
confundir as pessoas. Imprevisível, foi pioneiro também nas atitudes
ambivalentes”. (In Kiryrí Rendáua
Toribóca Opé/ Humberto Mauro por Ronaldo Werneck/ pg. 168 – Editora
Artepaubrasil/ São Paulo, 2009).
Pois é, o Zuenir usou a mesma palavra
(inquieto/inquietante) utilizada pelo Paulo para definir o Glauber. E deixou
para o baiano a aura de “imprevisível”, como nessa história (ou estória) de dar
ao personagem de Jardel o nome de Paulo Martins. O certo é que Glauber gostava
do Paulo, tendo várias vezes elogiado “O Anunciador”.
Paulo Emílio
gostou/não gostou
Em 19/04/1973, sob o título “O filme que o público não viu. E não
gostou", o grande historiador e crítico de cinema paulista (autor do
antológico ensaio Humberto Mauro,
Cataguases Cinearte, Editora Perspectiva, São Paulo 1974) publicava um
longo texto no Jornal da Tarde sobre O
Anunciador. Destaco alguns trechos a seguir.
“Em maio de 1970 viajei 12 horas, gripado – specialité
oblige (por “dever de ofício”,
traduzo) – para assistir ao lançamento de O Anunciador, o homem
das tormentas em sua cidade natal. Desde os fins dos anos 20,
quando Humberto Mauro filmou e o grupo Verde poetou, Cataguases não teve mais
sossego. Periodicamente brotam jovens vanguardistas decididos a verdejar a
tradição ilustre. Nos anos 40 o líder foi Francisco Marcelo Cabral e nos 60,
Paulo Bastos Martins, respectivamente produtor e diretor de O
Anunciador, o homem das tormentas, dedicado, aliás, a Humberto
Mauro, de corpo presente naquela noite memorável de maio. Dessa maneira o fio
do vanguardismo cataguasense, saltando tranquilamente as décadas de 30 e 50, é
retomado e esticado até arrebentar. Aparentemente, ele se encontra de novo
hibernando nos dez novos anos de pausa.
“(...) Revisto
hoje, O Anunciador parece vindo de muito longe. A produção deve
ter sido complicada, prolongada e, quando em 1970 o filme ficou pronto, era
tarde. A concepção e a justificação do filme devem se situar no começo dos anos
60, a idade de ouro da contestação juvenil. A obra guarda daquele tempo a
animação confusa, a crença nas virtudes criadoras do tumulto, um anseio místico
de liderança, a simpatia, a pressa, a angústia e o sentimento de que tem muito
o que dizer, mas dizendo-o mal, de forma repetida e interminável.
“(...) O Anunciador anuncia demais e o diretor Paulo Bastos Martins manifesta melhor seu talento precisamente quando interrompe o discurso do jovem profeta. Pena que não o tenha feito mais vezes com a eficácia e ironia com que introduz uma panela de pressão para ilustrar e cortar a fala do iluminado contra a técnica. As benvindas interrupções são, por sua vez e com frequência, inutilmente prolongadas. Foi boa a ideia de associar uma diatribe contra as ideologias com o monólogo de um diretor teatral enlouquecido no meio da cenografia montada para a peça. Mas sua fala é sem fim. Curiosamente o personagem demente, interpretado pelo próprio diretor do filme, está à procura de detalhes cristalizadores da emoção. Guimarães Rosa já advertira Glauber Rocha: "Deus está nos pormenores". Quando Paulo Bastos Martins se cansa e nos descansa da eloquência do Anunciador e se interessa pelos jovens que procuram mergulhar na terra, ou pela dança do fogo de Calibã, a anunciação se encarna.
“(...) Fui
rever O Anunciador, o homem das tormentas na noite chuvosa da
estreia em São Paulo, no Cine Cosmos. No começo da primeira sessão estava lá,
além de mim, um pequeno grupo de rapazes e moças que minha competência
pretendeu identificar como cataguasenses. Como o cinema estava vazio não pude
decentemente me instalar perto deles: seria indiscrição.
No correr
da fita entraram mais dois espectadores, um moço de vastos bigodes e um senhor
de idade. Resolvi assistir ao começo da sessão das 10 para ver o que acontecia.
O grupo jovem partiu no intervalo e o filme recomeçou para o triângulo formado
nas cadeiras vazias pelo senhor, pelo moço e por mim. Chegado o ponto que já
conhecia, o bigodudo foi embora. O velhinho de vez em quando olhava para ver se
eu ainda estava na sala e achei que não ficaria bem abandoná-lo. Mas ele também
se retirou e fiquei só. Durante alguns instantes não soube o que fazer. Se
saísse a sessão se interromperia, o projecionista e a porteira voltariam mais
cedo para casa, mas eu tinha o sentimento de que estaria traindo um filme
brasileiro e cataguasense. Fiquei até o fim e fui compensado.
“Resta um problema que há muito tempo desafia a perspicácia dos especialistas. Eu sabia que o público não iria gostar de O Anunciador, o homem das tormentas, mas como é que ele também soube antecipadamente a ponto de nem ir vê-lo?”.
Manaira
dourado, a filha de Paulo Martins, me enviou dois textos escritos logo após a
morte de sua pai. Um de sua mãe, Haydée Dourado, outro de Paulo Teles, ambos,
como Paulo Martins, também professores da Unicamp.
“Paulo Martins – escreve Haydée Dourado – lecionava no Instituto de Artes disciplinas na área de cinema e vídeo. Participou da criação da pós graduação de Multimeios ao lado da Professora Haydeé Dourado e de Hélio Solha. Docente do Departamento de Comunicação e Midialogia coordenou a realização de dezenas de produções de alunos em vídeo, audiovisual e cinema.
Foi, nos anos 80, Diretor do Departamento de Curta Metragem da Embrafilme, época em que impulsionou a realização de dezenas de filmes curtas. Dirigira, aos 22 anos de idade, o filme O Anunciador, o Homem das Tormentas”, longa produzido em Cataguases, Minas Gerais.
Após a aposentadoria seguiu
colaborando como professor na Unicamp até quando a saúde permitiu. Produziu
para a TV Unicamp, durante anos, o programa “Memória Expressa”. A documentação histórica conta
sua participação ativa no movimento do cinema novo no Brasil”.
Já o professor Paulo Teles, que havia
sido aluno de Paulo Martins, publicou a seguinte carta-aberta:
“Meu querido professor e amigo Paulo Martins, você pode ter partido deste mundo, no entanto, ao invés de parte do universo, o senhor agora é o próprio universo. Suas contribuições para a cultura, o cinema e para a educação brasileira, seja no cinema novo, no cinema independente, na Embrafilme, na Secretaria de Comunicação da Presidência da República e na Unicamp, a documentação histórica falará por si e por você. Da nossa parte, muito obrigado por ensinar a mim e ao mundo que o valor, a inteligência e a sabedoria das pessoas residem muito além das necessárias páginas acadêmicas publicadas pelos anais indexados da vida. Até breve, Excelência! Paulo Teles”.
Fala o Anunciador, o próprio
Também meu amigo Carlos Moura, que protagonizou o filme O Anunciador, no papel do próprio, assim se pronunciou logo que comuniquei a morte de Paulo Martins:
“Lástima! Embora nossa (con)vivência tenha sido
muito curta – durou exatamente o período da “juventura” cataguasense, terminando
com O
Anunciador – reconheço que ele foi muito importante e influente na minha formação
cultural e artística. Era uma pessoa difícil e isso ajudou a nos afastarmos.
Mas talvez o difícil tenha sido eu e não ele... Qui lo sa?”.
Revi O Anunciador nesta manhã de sexta-feira, uma semana exata da morte
de Paulo Martins. Deixo a seguir o link para que assistam ao filme. Na verdade,
uma versão extraída de uma exibição para a TV, vinda lá dos anos 80 ou 90, não
sei mais. E com todas as falhas de reprodução. Nessa cópia, o filme é
apresentado pelo próprio Paulo Martins, que diz tratar-se de “um filme estranho,
a partir de um fenômeno não conhecido, um filme feito de uma maneira irregular.
É como se o próprio filme estivesse reagindo diante de um elemento estranho. (...)
Na época, muita gente comparou meu filme ao Teorema
do Pasolini, comparação que acho equivocada: eu escrevi o roteiro desse filme
em 1966 e, pelo que sei, Pasolini realizou Teorema
muito depois. (...) Eu acho o meu um filme instigante, feito com parcos
recursos. Mas é um filme com um grande dinamismo, que encobre os parcos
recursos que normalmente os filmes brasileiros têm”.
Eu tive uma modesta participação no filme do Paulo, numa cena filmada no Rio, no escritório do poeta e produtor Francisco Marcelo Cabral. Ali, numa mesa com "executivos" de paletó e gravata, discutia-se a “enorme disparidade” entre o lápis e o ovo. Eu defendia as vantagens do lápis, enquanto o artista plástico Newton Cavalcanti defendia o ovo e suas possibilidades. Só mesmo Paulo Martins para inventar uma sequência surreal como essa. Verdade que, revendo agora, digo novamente o que já disse antes: apesar de ocasionais falhas, eu gosto, e ainda gosto muito, do rol de surpresas, achados e invenções trazidas por O Anunciador, o Homem das Tormentas”. Como gostava, e vou continuar gostando para sempre do meu querido amigo Paulo Martins.
https://www.youtube.com/watch?v=xyWtv7OA1DE
Ronaldo Werneck
Cataguases, 22/11.24
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