No próximo dia 6 de setembro
em Cataguases, a partir de 18 horas, o poeta-professor Joaquim Branco lança na
Casa do Livro (Av. Astolfo Dutra, 25), sua nova obra, “Entrelinhas”. É no
branco das entrelinhas, em suas pequenas pausas, que o texto literário sugere
imagens, significados que se incorporam ao pensamento do leitor. No branco que
“fala”, na força desse branco muito bem sacado no livro de Joaquim. Como ele
mesmo diz, no texto de abertura: “Entrelinhas são veredas deixadas pro um autor
para que o leitor se introduza na sua obra e até contribua a seu modo,
percorrendo caminhos ainda não navegados”.
Todo texto literário se
aninha nas entrelinhas. É ali que ele “fala” com o leitor, polissemicamente.
Então, é um achado o título deste livro, que diz desde a capa ao que vem. Diz,
numa só palavra, tudo que o leitor nele irá encontrar. Pois é nas entrelinhas, no
“parar para pensar”, que o leitor se vê frente à frente com as pensatas do autor
– é dali que surgem à tona, que emergem os recônditos, as profundezas de cada
texto. Erudito, intelectual de primeira ordem, Joaquim Branco desenha aqui um
mapa, traça as veredas literárias de grandes autores, do Brasil e do
estrangeiro. Veredas, palavra certa. Palavra-símbolo de Guimarães Rosa, umas
das preferências literárias de Joaquim (ao lado de Jorge Luis Borges e Kafka),
e que é abordado em quatro dos textos do livro.
Um livro capaz de ousadias e
descobertas, como comparar – e até inverter, entrecruzar – lírica e antilírica na
obras de Manuel Bandeira e João Cabral de Melo Neto, dois poetas pernambucanos,
mas aparentemente tão distantes. E
tornar às avessas o lirismo de Bandeira, que se faz despojado, concreto; e o
poema a palo seco de Cabral, de repente eivado de lirismo. Achados que Joaquim
nos oferece em poemas/fragmentos como aquele Bandeira “concretista” de “a onda
anda/ aonde anda/ a onda?// a onda nada/ ainda onda/ aonde? aonde?// a onda a
onda”. Ou um Cabral subitamente lírico: “(...) Pois, assim, no telefone/tua voz
me parecia/como se tal manhã/estivesses envolvida,/fresca, e clara, como se/
telefonasses despida,/ ou, se vestida, somente/ de roupa de banho, mínima”. E nessas abordagens – o lirismo em foco, por
exemplo – Joaquim Branco, em parágrafos paradoxalmente secos e curtos, traça um
conciso panorama do lirismo ao longo dos tempos. Uma aula de um poeta que sabe
o que fala, coisa de grande professor.
Mas o texto literário só
funciona em sua plenitude quando conta com o feedback do leitor. Leitor-autor “em processo”. E Joaquim aqui nos
remete a Borges: “a parte que cabe ao leitor é tão importante quanto a do
escritor, pois pertence a ele a fase de consumação (e do consumo) da obra de
arte”. Que, por sua vez, nos leva a Hans Robert Jauss (1921-1997) e Wolfgang
Iser (1926-2007), fundadores da Estética da Recepção, escola que desenvolveu no
pós-guerra alemão uma noção dinâmica do leitor, ouvinte ou espectador como
fator essencial à constituição da obra de arte. Dizia Jauss: “para que a
literatura aconteça, o leitor é tão vital quanto o autor”.
Nesse “jogar com o leitor”,
o livro de Joaquim Branco é enriquecido com abordagens de jovens autores cataguasenses,
como “O Homem Interdito”, de Marcelo Benini, ou dos livros “Beirais das
Gerais”, do fotógrafo “portuguases” Henrique Frade, com texto de Leonardo
Magalhães Gomes, e “umÁrvore”, de Fernado Abritta. Também do sempre presente
Rosário Fusco, de Ascânio Lopes, ou de outros autores que andam meio esquecidos
– e cuja obra é bom relembrar, como o também “verde” Camilo Soares, os poetas
Henrique Silveira e Delson Gonçalves Ferreira (“A lua/varre a rua/com sua
vassoura/de luar.//Bem devagar.//Numa teia, uma aranha/estranha/a lua cheia”), ou
a grande poeta e romancista Lecy Delfim Vieira: “Precisarei de alimento, água
bússola, companheira./ – será que não há no mundo quem queira comigo ir? – inda
que não olhe meus olhos/ inda que vá por partir/ – Fundarei o céu e a terra só
pra ter aonde ir”.
Fora isso, “Entrelinhas” nos
oferece excertos de autores do calibre de Hemingway, Charles Dickens, Allen
Ginsberg, Daniel Defoe, Emily Dickinson. Sem esquecer, é claro, os já citados
Guimarães Rosa, Franz Kafka e Jorge Luis Borges. O livro de Joaquim Branco é um
vasto espaço para o leitor se deleitar. Mas não para “se deitar”. Cabe a ele,
leitor, “trabalhar” esses textos com vagar, deles se apossar com todo o direito
e, de repente, perceber que pode também ser o autor escondido nas entrelinhas.
2 comentários:
Desejo muito sucesso ao Branco.
Boa surpresa. Apreciei a resenha. Sucesso no lançamento! Abcs, Ricardo Alfaya.
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