Invenção & reinvenção: termos que rimam e são característicos de Henrique Frade, que também rima com criatividade. Fotógrafo por excelência, ele tem imensa capacidade de nos surpreender a cada trabalho. Rotas Constantinas é uma exposição que traz o complexo e sempre inesperado pensar desse multiartista ao congregar fotografias, desenhos, instalações. E por meio dessas multiformas enfocar – 200 anos passados do acontecimento – os caminhos de Constantino José Pinto ao adentrar, em 1817, a então aldeia de São Paulo Manoel Burgo, atual município de Muriaé.
Natural de Barbacena (1874), após sua nomeação como Vice-Diretor de Índios por Guido Thomaz Marlière, Constantino estabeleceu-se em 1819 no quartel onde é hoje a Igreja do Rosário. Foi quando promoveu o crescimento da aldeia e ampliou por vários caminhos o comércio da poaia com os indígenas da região. Conhecida hoje como raíz do Brasil, a poia é uma planta com propriedades medicinais utilizada desde o século XVII e que era muito popular entre os índios tupis e os jesuítas. Constantino procurou dar instrução e introduzir os indígenas na religião católica. Seu nome chega inclusive a ser aproveitado por eles para batizar seus filhos.
Pois são esses caminhos por ele ampliados – as muitas rotas desbravadas por Constantino – o escopo principal dessa exposição, por onde perpassam dois séculos da ocupação regional, com seu foco voltado particularmente para as contribuições populares, muitas vezes esquecidas pela História. Encontram-se também nesses caminhares o fausto das fazendas, das grandes propriedades e suas muitas vezes requintadas construções. Mas Rotas Constantinas debruça-se mais amiúde na história com “h” minúsculo, nas muitas histórias – mineiras, maneiras – que se ouvem ainda agora nos cantões mais distantes do município. Causos do interior mais profundo, contados entre pitadas de fumo de rolo, feijão de tropeiro & quejandos. Toda essa mineiridade que subitamente, e com toda a força, marca presença nessa mostra.
No início do século XX, havia no rio Muriaé enorme manancial de peixes, hoje quase inexistentes: acarás, dourados, lambaris, piaus, robalos surubins, entre muitos outros. Contava ainda a região com grande quantidade de árvores de várias estirpes, como angicos, cedros, jacarandás, quinos, sassafrás, sucupiras, vinháticos – e de frutas silvestres: araçá, goiaba, ingá, jabuticaba, sapucaia – hoje também praticamente inexistentes. E nessas árvores encontravam-se inhambus, jacus, lontras, macacos, onças e outros e outros animais, até mesmo o bicho-preguiça na característica lentidão de seu movimentar-se. Nada, ou muito pouco disso, se vê hoje.
Mas essa não é propriamente uma exposição nostálgica. É, antes, mostra em ritmo e tempos de modernidade – interativa, lúdica, induzindo o visitante à intensa participação no embalo dos jogos, em atuações na internet. A proposta é “conheça sua terra”, teste seus saberes sobre Muriaé e cercanias. Para tanto, a exposição – totalmente up-to-date – disponibiliza aparelhos de tv, mobiliza instagram, facebook, youtube, congrega escolas e escolares para ativa participação. A história de Muriaé vai sendo reconstruída ao vivo, atual e atuante, motivada pela participação dos visitantes, que se espera intensa.
O prefeito de Muriaé, Marcos Guarino de Oliveira, fala na abertura da mostra. |
É com grande prazer que a Fundação de Cultura e Artes de Muriaé-FUNDARTE disponibiliza na Galeria Mônica Botelho do Grande Hotel a mostra Rotas Constantinas. Está aqui em cada uma dessas salas a marca do artista Henrique Frade, sua inquietação absoluta, sua intensa capacidade de nos surpreender, seu olhar diferenciado sobre um mundo que achávamos conhecer no cotidiano – mas que ressurge inteiramente novo por meio de seus apanhados fotográficos, de suas criativas reinstalações. Frade é um multiartista como poucos. E com sua acuidade visual nos ensina, como poucos, a rever o que pensávamos saber desde sempre, mas que na verdade desconhecíamos. Rotas Constantinas é por excelência um fascinante jogo de redescobrimentos.
Ronaldo Werneck
Outubro de 2022
Nenhum comentário:
Postar um comentário